quarta-feira, 29 de novembro de 2006

“Não matarás”- Sexto Mandamento:

Este mandamento aprecia a vida e a coloca na correta perspectiva. Nele aprendemos a sacralidade da existência, reconhecemos que a vida é um dom de Deus. Não pode ser banalizada, manipulada, nem explorada como um objeto comercial. Não se pode desconsiderar seu precioso valor.
O verbo “viver” em inglês é “to live”. Se invertermos este termo “live”, teremos outra palavra sugestiva: “evil” (mal). Assim como na língua inglesa precisamos considerar que o mal é oposto à vida. Matar é desprezar o valor e significado da existência e desconsiderar que Deus é o Senhor da vida. Onde encontramos pessoas e estruturas que desvalorizam a vida, teremos ali a expressão do mal, seja qual for a explicação que se dê a esta atitude, ela será sempre maligna. O bem exalta a vida. Deus valoriza a vida!
Por isto não temos o direito de tirar a vida do outro, uma vez que a vida é doação divina. Apenas Deus, que a dá, pode tirá-la, no seu tempo, da sua forma, dentro de seus propósitos. Dar e tirar a vida são prerrogativas divinas.
Nossa sociedade tende a relativizar o valor da vida e a banalizá-la. Acostumamos facilmente com a morte, nos tornamos apáticos. Apatia (a-pathos) é uma fuga do sentir. Ela opera como o instinto da morte de Freud. Assim é que estatísticas como o assassinato de 50 mil pessoas anualmente no Brasil não nos assusta mais. Isto demonstra quão pouco a vida é valorizada em nosso país. Centenas de pessoas morrem de igual forma de fome, guerras vazias, prepotência de ditadores em outras partes do mundo. Não seria esta uma forma de co-participação no projeto da anti-vida? Não seria isto uma forma de matar?
Este mandamento também lida com a trágica situação do infanticídio que acontece nas clínicas de abortos clandestinas cujos números chegam aos milhares. Certa mulher para justificar o aborto afirmou que por ser dona do seu corpo podia fazer o que bem entendesse com ele. Este princípio de fato é real, ela pode amputar uma de suas pernas, se assim desejar, ou arrancar um órgão de seu corpo, mas a criança, que está no seu útero, é outro ser dentro do seu corpo. Portanto, a prática do aborto é também uma quebra do sexto mandamento.
Jesus dá uma dimensão ainda mais profunda a este mandamento, ensinando que o ódio nutrido e expressões de desprezo, desconsideração e descaso dentro de nossos corações são formas subjetivas de matar o irmão, e quem faz isto incorre no julgamento de Deus (Mt 5.21-26). Matamos com nossa indiferença, apatia, ira e maledicência.
Matamos também idosos e deficientes, quando encontramos neles um valor meramente utilitarista. Nossa sociedade focalizada apenas no sucesso, lucro e conquista tende a destruir aqueles que não são mais úteis.
Este texto nos alerta a não conspirarmos contra qualquer irmão, nem contra nossa própria vida. Alerta-nos também contra o suicídio. Uma vez que você não é o autor da vida, não pode dispor dela para a auto-destruição. A vida é um dom!
Uma visão positiva da vida pode alterar nossa visão de universo e de valor próprio, afinal, ideologias são antropologias. É isto que este mandamento pede de nós. Que valorizemos o ser humano uma vez que ele foi criado à imagem e semelhança de Deus.

“Não adulterarás”.- Sétimo Mandamento

Entre os 10 mandamentos, talvez nenhum seja tão questionado quanto este. Contudo, é bom lembrar que a quebra de qualquer mandamento tem a ver com a quebra do primeiro mandamento que diz: “não terás outros deuses diante de mim”. O problema não é o que praticamos mas algo muito mais profundo que vai em nosso coração. Quando amamos outras coisas além de Deus, começamos também a valorizar e a negar as ordenanças de Deus.
Dr. Ruth Westheimer, terapeuta, disse na NBC Today Show "As gerações passadas não conversavam sobre sexo; a nossa não conversa sobre moralidade" (7/5/88). Nossa geração tem medo de tocar em áreas controvertidas. No entanto, adultério é expressamente proibido: “Não adulterarás” (Ex 20.14 e Dt 5.18). O relacionamento que Deus estabeleceu para o homem e a mulher é heterossexual, monogâmico e perpétuo, e considera importante a fidelidade. Mas, o que é mesmo adultério?
A tendência nossa é dar uma definição meramente lingüística: “Infidelidade conjugal; prevaricação”, mas tal conceito é muito pobre para aquilo que as Escrituras nos ensinam. A Bíblia enfatiza a espiritualidade da lei. A lei de Deus é espiritual no sentido de que atinge os desejos mais profundos do coração.
Por esta razão Jesus enfatiza que adultério não é um problema só da ação do pecado mas também dos desejos e inclinações do coração. O pecado atinge os afetos, penetra na essência de nosso ser. Jesus redefiniu a lei de Moisés: "Você ouviram o que foi dito, ‘Não adulterarás, mas eu vos digo: qualquer que olhar uma mulher com desejo, já cometeu adultério" (Mateus 5:27-28). Jesus condenou não somente o ato do adultério, mas aponta para o fato de que adultério possui raízes bem mais profundas. Jesus nos convida a olharmos nosso coração, a irmos ao encontro de nossas fontes internas. O pecado se encontra no coração.
Temos a tendência de vermos os mandamentos de Deus como algo restritivo, no entanto, o objetivo de Deus não era atar um fardo pesado sobre nossos ombros. Seu desejo era gerar vida em nós. O lar é o primeiro universo da felicidade do homem. O adultério sempre envolve mentira, traição, engano. Quem já passou por experiências em familia, sabe quão dolorido é o processo do adultério. As novelas e filmes tendem a minimizar o efeito devastador que o adultério traz dentro de casa, mas centenas de famílias são destroçadas por causa da infidelidade conjugal.
A fidelidade do casal ensina respeito, fidelidade, valor. Deus retira aqui a tendência comum nos casamentos de usar, dispor e tratar o outro como mero objeto.
O lar que se rege por este comportamento, ensina respeito, dignidade, igualdade, compreensão, confiança mútua. Esta beleza é retirada quando casais se orientam pela mentira, traição e falsidade. Adultério quebra a unidade essencial de um casamento, pois fere princípios relacionados ao afeto. Na verdade, o aspecto sexual aqui está em segundo plano, o que se tem em vista é a ética matrimonial e o coração. O adultério faz do outro um objeto e trai a confiança e a relação de dignidade que devem existir dentro do casamento.

terça-feira, 14 de novembro de 2006

“Honra o teu pai e a tua mãe” - Quinto Mandamento:

Os quatro primeiros mandamentos estão direcionados à nossa relação com Deus. Este é o primeiro mandamento da lista de nossos deveres para com os outros, e inicia com nossos relacionamentos familiares: Honra o teu pai e a tua mãe!
Mesmo sabendo que todos os mandamentos contém uma ênfase positiva, o único que vem escrito sem o “não” é o Quinto Mandamento.
Uma das questões que este mandamento suscita é “O que significa honrar pai e mãe?” Por esta razão tenho perguntado aos pais o que significa esta honra.
Invariavelmente a resposta dos pais é voltada para a dignidade do filho. Pais são honrados quando os filhos possuem honra. Pais se plenificam nos filhos. O fracasso do filho fere a auto-imagem dos pais, traz culpa, humilhação e vergonha. O filho que honra é aquele que não traz embaraços para seus pais.
Em 1989, o então, o Presidente do Banco Central do Brasil, declara aos jornais, ao ver seu filho envolvido num grave escândalo policial: “Meu filho sempre foi um desastrado”. Ao afirmar isto, ele não estava com raiva e nem havia ódio, mas profunda tristeza. Honrar é dignificar. Os pais entram num processo de desestabilização e culpa quando seus filhos são desregrados. Ouvi sobre a confissão de um homem logo após seu primeiro infarto: “Se morrer, saiba que meus filhos me mataram”. “O filho sábio alegra seu pai, mas o insensato é a tristeza de sua mãe” (Pv. 10:1).
O livro de provérbios é cheio de recomendações sobre este assunto: “Quem maltrata o pai, e expulsa a mãe é filho indigno e infame” (Pc 19.26). Honrar significa considerar com dignidade, atender suas necessidades com respeito. É mais que obediência, embora isto esteja implícito na honra.
Além disto, este mandamento impõe à comunidade o cuidado com os idosos que já não são mais produtivos. Possui uma dimensão social. Somente a consciência que não foi sensibilizada por Deus enxerga os seres humanos como meros agentes de produção. Por isto, não existe aposentadoria que substitua a responsabilidade de honra dos filhos para com seus pais.
Este Mandamento é também curioso, porque é o único mandamento com uma promessa. “Honra o teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor Deus te dá” (Ex 20.12). Honra os pais significa qualidade de vida para os filhos. Não existe filho “abençoado” que não possua uma relação de cuidado, zelo e honra pelos pais, por mais difíceis e complicados que estes sejam. E olha que já pais bem complicadinhos por ai... Gostaria ainda de ressaltar que este mandamento não é uma carta branca para pais levianos, pérfidos e irresponsáveis.
Numa época onde a autoridade é tão relativizada, precisamos lembrar do propósito de Deus ao estabelecer a família. Em provérbios 30.17 temos uma advertência sinistra e grave sobre este assunto.“Os olhos de quem zomba do pai ou de quem despreza a obediência à sua mãe, corvos no ribeiro os arrancarão e serão comidos pelos filhotes de águia”. Obviamente esta é uma linguagem simbólica, mas o sentido salta aos olhos do leitor atento. Não honrar os pais, retira de nós a capacidade de enxergar corretamente a vida, afinal, os olhos são a lâmpada da alma...

“Lembra-te do dia de sábado, para o santificar” - Quarto Mandamento

Um dos mandamentos que tem causado mais discussão é a questão do sábado, isto porque os homens historicamente fizeram uma significativa inversão de valores no seu sentido.
O povo de Israel foi escravizado por 430 anos, durante este tempo não teve direito a lazer, realizava trabalho forçado e sofreu violenta humilhação no desempenho de suas atividades. Não é sem razão que este mandamento possua uma forte recomendação social: “não farás obra alguma nesse dia, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o peregrino que viver das tuas portas para dentro, porque o senhor fez em seis dias o céu, a terra e o mar, e tudo o que neles há, e descansou ao sétimo dia; por isso o senhor abençoou o sétimo dia e o santificou” (Ex 20.10-11). Deus estava preocupado com o ser humano e com a própria natureza que se tornara vítima da ganância e da exploração do excesso de trabalho.
Jesus teve profundos conflitos com religiosos de seu tempo por causa da questão do sábado. Qual era o problema? Os homens transformaram o sábado num instrumento de opressão religiosa, ao invés de reconhecerem sua dimensão libertadora e humanitária. Jesus sintetiza isto numa discussão com os fariseus, que eram os xiitas de seu tempo afirmando: “O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado” (Mc 2.27). Esta inversão na interpretação tem sido fatal na história do cristianismo.
Qual é o objetivo então do sábado? Este termo vem do hebraico “shabath” que significa “descanso”. Deus deseja que os homens entendam a importância de parar suas atividades, e para fazer isto, ele mesmo deu o exemplo. Será que Deus estava preocupado consigo mesmo? Estava com excesso de horas extras? Naturalmente não. Seu objetivo era dar exemplo para que entendêssemos que precisamos aprender a descansar, a tirar tempo para repor nossas forças físicas, para repensar nossas atividades. Quando não descansamos é porque intimamente sofremos um complexo de onipotência e achamos que somos mais imprescindíveis que Deus. No entanto, é bom lembrar que o cemitério está cheio de gente insubstituível. Guardar o dia de sábado é reconhecer que temos direito ao descanso e perceber-se como um ser livre para viver. O que trabalha sem descanso é escravo! Além do mais, deve manifestar esta preocupação com seus funcionários, empregados, parentes e até mesmo animais. Todos devem e tem o direito ao descanso.
Além de refazer nossas forças e encontrar descanso, este tempo também é um convite para olharmos para o céu, e este é um objetivo muito claro para o shabath: Tirar um dia de adoração, agradecer a Deus a libertação e lembrar que Deus também tem ouvido nosso clamor. Este é o dia que separamos para prestar culto a Deus, ler sua palavra, orar, refletir sobre seus valores, colocar nossa vida a seu serviço para libertar outros que ainda vivem na opressão e na escravidão.
“Ao nos dar um dia como tal, Deus destaca a nossa humanidade, nos lembra que devemos ser tratados como pessoas e que não fomos feitos para o trabalho, mas para Ele”.

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

“Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão” -Terceiro Mandamento.

Um antigo catecismo faz a seguinte pergunta: Qual é o terceiro mandamento? E a resposta é: "Não tomarás o nome to Senhor teu Deus em vão, porque o Senhor não terá por inocente aquele que tomar em vão o nome do Senhor seu Deus” (Ex 20.7); E o que se exige no terceiro mandamento? No terceiro mandamento exige-se que o Nome de Deus, os seus títulos, atributos, ordenanças, a Palavra, os sacramentos, a oração, os juramentos, os votos, as sortes, suas obras e tudo quanto por meio do quê Deus se faz conhecido, sejam santa e reverentemente usados em nossos pensamentos, meditações, palavras e escritos, por uma afirmação santa de fé e um comportamento conveniente, para a glória de Deus e para o nosso próprio bem e o de nosso próximo”.
O terceiro mandamento nos adverte a não usarmos o nome de Deus de forma vã, irreverente, profana, supersticiosa ou ímpia; a blasfêmia, o perjúrio, toda abominação e juramentos ímpios; a violação dos nossos votos, quando lícitos, e o cumprimento deles, se por coisas ilícitas; o abuso das criaturas ou de qualquer coisa compreendida sob o nome de Deus, para encantamentos ou concupiscências e práticas pecaminosas; a defesa da religião por hipocrisia ou para fins sinistros.
Tomar o nome de Deus em vão é associar sua santidade a qualquer projeto meramente humano e vazio. Na história da humanidade o nome de Deus tem sido usado para justificar gestos e atitudes profanas e até mesmo luciférios. Usa-se o seu nome para instrumentalizar a injustiça, praticar o mal, explorar o pobre, roubar e matar, associando-o à mentira e malandragem. Quantas coisas malignas tem sido feitas em nome de Deus...
O nome de Deus tem sido usado em vão, na boca dos blasfemos e insolentes, no linguajar do profano e negligente, mas infelizmente também tem sido usado na boca dos religiosos para justificar atos que não tem nada espiritual. A pior forma de dessacralizar este santo nome encontra-se na religiosidade e liderança inescrupulosas, em falsos profetas disfarçados de ovelhas. Por isto surgem as guerras santas, navios negreiros, inquisições religiosas, queima de bruxos e hereges, projetos megalomaníacos de líderes auto centrados e altares de sacrifícios humanos em nome de Deus. Em seu nome se fazem romarias da impiedade e cultos a demônios, “profetadas” são dadas como supostas profecias, interpreta-se a Bíblia para justificar o mal e a intolerância, cantam-se hinos para ocultar a perversidade e faz-se orações para auto promoção.
Tais atitudes, feitas por ignorância ou cinismo, desprezam intencionalmente ou não a advertência de que “o Senhor não terá por inocente aquele que tomar em vão o nome do Senhor seu Deus” (Ex 20.7);
O nome de Deus era tão sagrado para os judeus piedosos que alguns usavam uma pena exclusiva só para escrever o tetragrama IHWH, cuja tradução melhor em português seria Javé. Deus se apresenta a Moisés como “Eu sou o que sou”, mas a conjugação verbal poderia ser “Eu sou aquele que é”. Por isto, a falsidade, a mentira, a vaidade, não podem estar associadas ao nome de Deus.
Este mandamento proíbe toda profanação e abuso das coisas por meio das quais Deus se dá a conhecer. Portanto, não usemos seu nome para proteger a mentira e levar vantagem pessoal. O nome de Deus é santo!

terça-feira, 24 de outubro de 2006

“Não farás para ti imagens de escultura” -Segundo Mandamento:

A iconoclastia, ou o ato de criar objetos e adorar seres representados em formas humanas ou animais, sempre atraiu a humanidade, tanto nos tempos antigos quanto modernos. Por isto, em geral, os templos que são descobertos pelos arqueólogos nas suas escavações, normalmente trazem figuras de divindades que eram adoradas. No entanto, quando um artífice, oleiro, ou ferreiro dá forma ao pau, pedra e barro e depois se ajoelha diante de sua própria obra, isto se torna abominação aos olhos de Deus: é a quebra do segundo mandamento.
O segundo mandamento nos adverte a que não nos ajoelhemos diante de nenhum objeto artisticamente trabalhado, ou imagens representadas em desenhos ou fotografias e lhe dirijamos orações, oferendas ou cultos. Muitos têm sido enganados com superstições e imagens, mas os ídolos apenas servem para tirar nossos olhos de Deus.
No Salmo 115 Deus adverte contra a idolatria nestes termos: “prata e ouro são os ídolos deles. Obra das mãos dos homens. Tem boca e não falam, tem olhos e não vêem; tem ouvidos e não ouvem; tem nariz e não cheiram. Suas mãos não apalpam, seus pés não andam; som nenhum lhes sai da garganta. Tornem-se semelhantes a eles os que os fazem e quantos neles confiam. Israel, porém, confia no Senhor” (Sl 115.4-9).
O profeta Isaias também adverte sobre “a loucura da idolatria”. Diz que o artífice estende as mãos na madeira e esboça uma imagem, com parte da madeira se aquenta e coze o pão, e também faz um Deus se prostra diante dele. Metade queima no fogo e com a outra metade faz um Deus e o adora. Por isto afirma que só uma pessoa sem senso lógico poderia fazer isto. No entanto, no mundo inteiro, pessoas fazem exatamente assim.
Isto me obriga a indagar: Se a idolatria é algo assim tão grotesco, porque tantos ainda se inclinam, adoram e dirigem suas orações para obras de arte, pedaços de madeira e gesso, fazendo preces aos ídolos mudos? Qual é a lógica da idolatria.
Mais uma vez o problema está em meu coração. Com a idolatria penso que posso “manipular o sagrado”. Faço uma representação de Deus, e o concebo à minha imagem e semelhança. Deus é construído a partir de minha imaginação. Assim como os deuses gregos tinham as paixões dos seres humanos, meus ídolos são construídos conforme aspirações pessoais. Procuro fazer um Deus parecido comigo. Eu não sou mais “imagem de Deus”, a quem tenho que prestar contas e que me diz o que devo fazer, antes construo um Deus que fará “como e o que eu acho” que ele deve fazer. Edifico assim um Deus que fica disponível às minhas paixões, crio um Deus parecido comigo. Um Deus do meu tamanho. Penso assim poder manipular o sagrado a meu favor, de colocá-lo à minha disposição, movendo, dispondo e deslocando as forças sobrenaturais e ocultos como quero que as coisas se dêem. É a onipotência humana disfarçada em atitudes sagradas. No entanto, Deus é Deus, e não se deixa manipular por artifícios que engenhosamente engendramos.
Por isto o segundo mandamento nos ensina: “Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima dos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhe darás culto, porque eu sou o Senhor teu Deus, Deus zeloso” (Ex 20.4-5).

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

“Não terás outros deuses diante de mim”.Primeiro Mandamento:

Curiosamente o primeiro mandamento não adverte contra o ateísmo, mas contra o politeísmo. Isto faz um enorme sentido: O grande problema do homem não é a descrença de Deus, mas a incapacidade de viver sem deuses. Plutarco afirmou que podemos encontrar cidades sem paredes, sem literatura, reis, casas ou dinheiro, sem ginásios ou teatros, mas nunca veremos uma cidade sem templo e deuses. Não existe nenhuma nação tão bárbara ou raça tão bruta que não esteja imbuída da convicção de que há um Deus. O problema não é o “a-teísmo”, mas o “poli-teísmo”.
A pergunta que surge é: “Por que não ter outros deuses se não existe outro Deus além do Deus único e verdadeiro? Por que proibir a adoração de outros deuses se estes não passam de imaginação ou projeção de temores e desejos do coração humano?”.
O fato é que facilmente forjamos outros deuses. Caso você queira saber se possui outros deuses que tem governado sua vida, basta perguntar a si mesmo: “existe algo ou alguma coisa que temo, sirvo, confio e amo mais que a Deus?” Se sua resposta é afirmativa, certamente existe outro “deus" governando sua vida.
Os deuses que governam nossas vidas se apropriam de muitas máscaras e faces, recebem diferentes nomes, mas cada um deles exige, a seu modo, adoração, liturgia e cultos apropriados. Onde você coloca seu coração é exatamente onde se encontra o nicho de sua divindade. E isto atinge a todos: protestantes, católicos, espíritas, ateus, agnósticos. Todos nós construímos altares aos deuses que controlam nossa vida.
Por isto, neste primeiro mandamento, é como se o Deus único e verdadeiro estivesse a nos dizer: “procure que somente Eu seja o teu Deus e não busque a nenhum outro. Os bens que te faltam, espera-os de mim (...) Não faça o teu coração depender de nada, nem confies em nada que não seja Eu mesmo, nenhum ídolo deste mundo: o dinheiro, a erudição, o poder, outros homens (Lutero)”.
Os ídolos se apresentam disfarçadamente e nos fazem pensar que não podemos viver sem eles. Existem por aí muitos substitutos de Deus. Alguns exigem sacrifícios tremendos e mesmo assim nós os atendemos, outros reclamam devoção, ofertas e todos nos dão a impressão de que não podemos viver sem eles. Por isto, o primeiro mandamento fala da exclusividade de Deus.
Na verdade, normalmente quebramos os outros mandamentos por causa da quebra deste primeiro. É por acharmos que outros deuses podem nos dar prazer mais que o Deus verdadeiro é que nos submetemos a eles e o adoramos. Quem perde o temor ao Deus verdadeiro, pratica toda espécie de sordidez. “Um ídolo não é somente uma estátua, um fetiche, mas pode ter muitas formas e disfarces, porém uma coisa é comum aos ídolos: eles cegam os homens e não deixam que vejam a verdade, tiram a liberdade e sacrificam vidas”.

Conclusão: Bebendo água do mar
A diferença entre confiar em ídolos e confiar em Jesus, é a mesma entre beber água salgada e água fresca. Duas coisas acontecem quando você bebe água do mar: você fica com mais sede e começa a enlouquecer. Idolatria é como água do mar. Sua visão da realidade torna-se embotada. Coisas que pareciam tão erradas no passado tornam-se aceitáveis agora, mas mesmo assim, você não está satisfeito. Um deus falso é apenas um deus falso. Ele mente. Promete vida, mas traz morte. Somente o nosso Deus pode nos abençoar e nos encher com vida. Somente Jesus é a água da vida, água fresca que sacia a nossa sede.

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

Os Dez Mandamentos

Nesta semana iniciaremos uma série de artigos sobre o Decálogo. Durante séculos estas Leis se tornaram referência normativa para grandes nações, inspirando pensadores, legisladores e reis.
Os Dez Mandamentos foram entregues a Moisés, por volta do ano 1250 a.C., nos dias de Ramsés II, logo depois que o povo de Israel se libertou do cativeiro egípcio, ao qual esteve subordinado por 430 anos. O povo encontrava-se aos pés do Monte Sinai, e as leis foram dadas para prover regras sobre relacionamentos dos homens com Deus e homens com homens.
Antes de entregar os mandamentos, Deus “justificou” ou “explicou” a necessidade de tais leis, por isto hoje, vamos analisar estas “razões”. Este prólogo clarifica os motivos pelos quais devemos atentar para estes preceitos.
Duas razões foram apresentadas:
1. “Eu sou o Senhor” – (Ex 20.1) Nesta afirmação Deus revela quem Ele é. O povo vivera em meio a muitos deuses pagãos da cultura egípcia que adorava entre tantos o Rio Nilo e o deus Ápis, representado por um touro. Quando Moisés é enviado para libertar aquele povo, parece que não conhecia intimamente o Deus verdadeiro, porque lhe pergunta: “Quando os filhos de Israel me indagarem qual o teu nome, que resposta lhes darei?” E Deus lhe responde enigmaticamente: “Eu Sou o que Sou”. Neste prólogo aos Dez Mandamentos, Deus faz questão de apresentar sua identidade, de entregar seu cartão de visita.
2. “...Que te tirou da casa da servidão” (Ex 20.1) Curiosamente Deus não se revela como o Deus criador, juiz, ou legislador, mas sim libertador; com isto demonstra o tipo de relacionamento que ele queria ter com o povo. Deus queria que o povo o reconhecesse como alguém que o chamava para ser livre, que nunca mais se submetesse novamente ao jugo de escravidão moral ou físico. Não queria que o povo estivesse cativo, mas que vivesse em liberdade, justiça e fraternidade com todos os homens.
Os Dez Mandamentos são divididos em dois blocos: Os primeiros orientam sobre a atitude dos homens para com Deus, os seis últimos sobre os relacionamentos humanos. São normas para conduta humana, prescrições morais. Muitos vêem a Lei como instrumento de opressão, e temos que reconhecer que muitas vezes ela foi usada com tal objetivo, mas na verdade as leis existem para libertar, tornando-se indicadores que nos ajudam a esquivar de erros que nos afastam do projeto de Deus para nossas vidas.
Alguns imaginam os Dez Mandamentos como tradições fossilizadas, afirmando que ainda os adotamos devido à nossa necessidade de símbolos, já que gastamos os primeiros dez ou vinte anos das nossas vidas aprendendo os símbolos culturais (palavras, números e imagens) e por isto confundimos símbolos com a realidade. Este argumento é fácil de ser destruído. Imagine uma cultura na qual a quebra destes mandamentos se tornasse comum: Que o falso testemunho, o adultério, o assassinato, e a quebra dos demais, fosse considerada normativa. Seria esta uma sociedade viável?
Os mandamentos são dados para a vida. Não servem como instrumentos de punição, mas para organização de uma sociedade para que a vida seja celebrada. Para isto servem os Dez Mandamentos.

segunda-feira, 2 de outubro de 2006

Educação Política

Recentemente me chegou às mãos um interessante livro sobre educação financeira: “Pai rico, pai pobre”. O autor defende a idéia de que a maioria das pessoas não possui capacidade de ganhar dinheiro porque não tem uma mente educada para isto, e então sugere que as escolas tenham uma matéria chamada “educação financeira”, onde as crianças aprenderiam desde cedo a entender a lógica do sistema, a viver dentro de um orçamento e fazer projetos nesta área.
No início dos anos 70, Harvey Cox falava de uma “teologia da política”. Ele entendia que era importante discutir e orientar as pessoas para que pudessem se envolver no processo da construção de uma sociedade. Por isto estou proponho uma nova matéria nas escolas: A Educação Política.
Obviamente muitos irão questionar a validade da proposta. Uma das grandes dificuldades seria encontrar professores habilitados para educar as próximas gerações, mas certamente temos que começar de algum ponto, e este é um momento mais que apropriado para esta discussão, considerando a falta de capacidade crítica que nos cerca.
Por causa dos constantes escândalos e abusos do poder, a tentativa imediata de muitos é o abandono do compromisso democrático. Até mesmo gente bem preparada academicamente está pensando em votar nulo ou branco. Isto mostra quão pouco entendemos política.
O mundo político tem sido demonizado por determinados setores, como se a única coisa que pudesse sobreviver neste pântano fossem as cobras e grandes crocodilos. A ausência de uma consciência política impede a reflexão e a articulação madura sobre as questões públicas e sociais.
A participação política do ser humano tem um papel pedagógico, e o capacita a sair da situação de mero expectador da história, levando-o a superar o seu processo de alienação e a assumir plenamente sua politicidade. É também uma ferramenta apropriada para a crítica e a elaboração de leis que beneficiem a comunidade como um todo, não apenas certos setores socialmente privilegiados. Ajudaria ainda a exercer não apenas um papel de denúncia, mas a buscar soluções práticas e efetivas.
O pessimismo, o cinismo, a falta de esperança são fatores que conspiram contra a mobilização social. Samuel Escobar afirma: “no passado nos disseram para não nos preocuparmos em mudar a sociedade, porque precisamos mesmo é mudar os homens. Homens novos mudarão a sociedade. Mas quando os homens novos começam a se interessar em mudar a sociedade são avisados para não se preocuparem, que o mundo sempre foi mau, que esperamos novos céus e nova terra”.
O Evangelista Charles Finney afirmou: “impedem-se os reavivamentos quando igrejas assumem posições erradas com respeito aos direitos humanos”. Uma Educação política, seria portanto, de enorme valia para a futuras gerações.
A educação política poderia ser de enorme valia para corrigir não apenas a deformação metodológica de extremistas do MST, de políticos oportunistas da direita, de malandragens de políticos fisiologistas, mas abriria a mente das futuras gerações para aprender a julgar e a interpretar melhor os eventos históricos do presente.

segunda-feira, 25 de setembro de 2006

Deformação metodológica

Hesitei em escrever este artigo antes das eleições. As idéias já estavam claras na minha mente mas considerei que poderiam dar idéia de propósitos eleitoreiros. Como não estou defendendo a bandeira de nenhum partido, senti-me livre para fazer uma análise sobre o principal programa do governo Lula, que se tornou em seu grande trunfo eleitoral: O Bolsa-Família.
Qual é o problema de qualquer programa assistencialista?
Já em 1969, Paulo Freire escrevia com grande lucidez sobre este assunto em Educação como prática da Liberdade (Rio, Paz e Terra). Sua abordagem pedagógica é impressionante.
Para Freire, os programas assistencialistas roubam dos pobres o seu maior valor que é a dignidade, privando-os de uma inserção comunitária. Como não são convidados a refletir sobre suas possibilidades, não conseguem “fazer-se críticos e, por isso, (...) se tornam criticamente otimistas” (op. cit. 54)
Com tal compreensão, Freire demonstra que ao deixarem de ser passivas e tornarem-se agentes de sua história, “a desesperança das sociedades alienadas passa a ser substituída por esperança, quando começam a se ver com os próprios olhos e se tornam capazes de projetar (...) na medida em que vão se integrando com o seu tempo e o seu espaço” (id. Pg.54).
Os programas assistencialistas inibem a participação do povo nos processos decisórios, criando uma relação de dependência/dominação. Não sendo capaz de se envolver politicamente através do trabalho construtivo e da discussão de sua própria história, perdem o sentido da esperança. O impotente, que sequer pode trabalhar, está morto. “Quem se julga acabado está morto. Não descobre sequer sua indigência” (Id. pg 53).
O assistencialismo contradiz a vocação natural da pessoa e “faz de quem recebe a assistência um objeto passivo, sem possibilidade de participação do processo de sua própria recuperação” (id. Pg. 57). Freire vê nisto uma forma de agressão: “Violência do seu antidiálogo, que, impondo ao homem mutismo e passividade não lhe oferece condições especiais para o desenvolvimento ou a “abertura” de sua consciência (id. Pg.57). Este é o resultado didático do ócio remunerado ou da esmola oficial.
Luiz Gonzaga, antes destas reflexões de Freire, disse com muita propriedade:
“Mas doutor uma esmola,
A um homem que é são,
Ou lhe mata de vergonha,
Ou vicia o cidadão”.
(Vozes da seca, Zé Dantas e Luiz Gonzaga, 1953).
Jesus, ao encontrar um paralítico, disse-lhe: “Levanta-te,toma o teu leito e anda”. Interessante esta forma didática de ensinar. Jesus inspira fé e capacita o ser humano a andar com suas próprias pernas e a não depender de outro para carregar o seu próprio leito. Poderia apenas lhe dizer que estava curado, mas resolve capacitá-lo a romper o círculo de dependência que sempre caracterizara sua vida.
A prática da liberdade envolve este processo de capacitação do ser humano. Ninguém será livre, se a dignidade, o valor próprio e a esperança não lhe for entregue.

quarta-feira, 30 de agosto de 2006

Ganância, Ambição e Ética

Émerson afirmou: “A ganância e o monopólio reduzem a potência física e mental do povo. O povo afunda-se e corrompe-se na luta para subir” Pensamento vivo de Émerson, pg. 5.
Ganância e Ambição são termos correlatos. São vizinhos na literatura e compatíveis na lingüística e semântica. Contudo, pode-se estabelecer uma boa diferença entre estes termos. Ganância é o desejo desmesurado de ter mais, parece-se muito com a inveja, e por isto facilmente se torna voraz e mórbida. A literatura judaica afirma "tal é a sorte de todo ganancioso, e o espírito de ganância tira a vida de quem o possui" (Pv 1.19). Ganância revela sempre a sombra da alma, o lado escuro do desejo, por isto é algo sempre negativo.
Ambição, contudo, possui uma ambivalência, isto é, pode ser percebida no seu aspecto positivo e também no seu aspecto negativo. Uma boa ambição gera um desejo de estudar com diligência, trabalhar com esmero e com seriedade, subir na vida, se tornar um bom profissional, de estudar para se alcançar um fim, de ser alguém com dignidade. Na verdade, a ausência de ambição pode revelar a preguiça da alma, uma síndrome de Jeca tatu que olha para a vida e acha que tanto faz, para cima para baixo, para a direita ou esquerda, e vai deixando o pagode reger a minha vida: "deixa a vida me levar, vida leva eu..." Falta de ambição pode ser uma deformidade da alma e do caráter, revelar a preguiça e o desatino de quem nunca sonhou, nunca aspirou e nunca vai realizar nada, porque na mente destas pessoas a vida funciona pela lei da inércia, do acaso e do sortilégio.
Por ter o seu aspecto positivo, pode ser um grande fator motivador de sonhos e utopias. Com ambição se busca incansavelmente a cura da Aids, pessoas se articulam numa campanha pela moralidade e pelo bem, se mobilizam para minorar a causa do pobre e do esquecido. Tenho encontrado gente assim, que se gasta e se deixa gastar por um desejo ambicioso de ver a vida se tornando mais digna de ser vivida. Gente inconformada com a dor e a miséria.
A ética vai estabelecer os limites para que a Ambição trilhe no caminho da vida. É fácil ocorrer desvios nas nossas motivações. Stephen Kanitz, que foi o inspirador deste artigo, afirma: "Definir cedo o comportamento ético pode ser a tarefa mais importante da vida(...) Nunca me esqueço de um almoço, há 25 anos, com um importante empresário do setor eletrônico. Ele começou a chorar no meio do almoço, algo incomum entre empresários, e eu não conseguia imaginar o que eu havia dito de errado. O caso, na realidade, era pessoal: sua filha se casaria no dia seguinte, e ele se dera conta de que não a conhecia, praticamente. Aquele choro me marcou profundamente e se tornou logo cedo parte da ética na minha vida: nunca colocar minha ambição na frente da minha família".
Kanitz conclui dizendo: "Defina sua ética quanto antes possível. A ambição não pode antecedê-la, é ela que tem de preceder à sua ambição". Veja, 1684 ano 34 no 3 de 24 de janeiro de 2001

quarta-feira, 21 de junho de 2006

A PRESSÃO DA EFICIÊNCIA

Até o segundo jogo do Brasil nesta copa, uma palavra parece expressar o sentimento dos apaixonados torcedores: Frustração! Honestamente eu acho isto até positivo: O clima de já ganhou nunca foi bom, posto que ninguém ganha o jogo na véspera.
Afinal, o que aconteceu com o celebrado quarteto mágico, que pode ter de tudo e até mesmo ser quadrado, mas até agora sem nenhuma magia que gere encantamento? Onde está o aguardado encanto de Ronaldinho, que até agora deu apenas dois chutes a gols contra a Croácia e nenhum contra a Austrália, além de, literalmente, pisar na bola neste ultimo jogo?
Apesar de minha crítica, quero fazer uma defesa desta situação. Eu não gostaria de viver a pressão da eficiência que estes jogadores tem vivido. A cobrança que pesa sobre para se ter uma boa performance, ser eficiente todo tempo e atender sempre a expectativas de milhares de pessoas, ser genial, criativo e produtivo, é uma das maiores fontes de estresse.
Todos nós precisamos de espaço para o ordinário, para o comum, para vulnerabilidade e limitação, de não ter que provar nada. Creio que a tirania do sucesso é uma das mais fortes imposições sociais e uma das mais cruéis neste universo competitivo. Isto nos faz pensar que nossos filhos precisam ser competentes em todas as áreas: esporte, música, línguas, exatas, e assim, sair-se bem em todas as matérias. Por causa desta pressão, impomos uma agenda sobrecarregada de atividades sobre eles para que os mesmos alcancem eficiência e se tornem ícones. Assim fazendo, roubamos-lhes a vida e o direito de serem crianças, e isto os acompanha durante toda a vida. Entram na faculdade sob pressão e seguem assim ao disputar vaga no mercado de trabalho, sob enorme angústia em serem homens e mulheres de sucesso, acertar sempre e nunca fracassar.
Não percebemos quanto estresse isto gera neles e em nós, e quanto vazio isto provoca no coração, na mente e nos relacionamentos. Perdemos nossa própria vida, tentando achá-la.
Às vezes fico a pensar no significado das palavras de Jesus: “quem ama a sua vida, perde-a, mas aquele que odeia a sua vida neste mundo, preserva-la-á para a vida eterna” (Jo 12.25) O que isto quer dizer?
Creio que deixar de ser uma máquina de eficiência, ou um ser ”performático”, tem tudo a ver com este pensamento de Jesus, afinal, o grande alvo da vida não é eficiência, mas realização; não conquistas, mas doação; não aprendizado, mas plenificação, nem sucesso, mas significado, e isto se acha não no desespero louco do sucesso, mas no encontro de nossa alma inquieta e agitada com o centro maior de seu significado que é a relação com o seu criador.
Talvez se estivéssemos menos obcecados pelo sucesso, poderíamos amar mais, viver mais, comer melhor, desfrutar melhor as amizades, fazer sexo de melhor qualidade, adorar a Deus com maior disposição e disponibilizar tempo para servir aos outros com maior alegria. No entanto, estamos preocupados demais em termos e sermos sucesso, sem entender que nesta louca tensão, temos fracassado em nosso objetivo de ser gente.

quarta-feira, 14 de junho de 2006

Esporte e Cultura

Sempre vi o esporte como uma expressão da arte de um povo. Cultura e esporte estão sempre muito próximos um do outro. Com muita propriedade alguém já afirmou que o esporte não forma o caráter, apenas o revela.
Quando morei fora do Brasil fiquei impressionado com algumas características do esporte na cultura americana, e talvez, a partir desta leitura, tenha compreendido um pouco do pensamento americano e brasileiro.
Já viram quais são os esportes com maior poder de penetração na cultura americana? Sempre me impressionei com o wrestling, ou luta livre. Os estádios lotados, ingressos vendidos antecipadamente, canais de TV por assinatura transmitindo os eventos e milhares de americanos simplesmente apaixonados com aquela luta simulada. Se você disser que a luta livre é simulada, eles contestarão você. Afinal de contas, é uma luta. Todos sabem que os lances são treinados cuidadosamente e que, apesar da força daquele esporte, trata-se de uma luta simulada. Não para muitos americanos que crêem tratar-se de algo de vida e morte.
Não seria isto uma revelação da hipocrisia americana? A experiência parece dizer que sim. Pense num exemplo simples: Você pode beber uma cerveja na rua, desde que sua garrafa esteja dentro de uma sacola que não revela o rótulo. Se você resolver retirar a garrafa da sacola, pode ser abordado por um policial, mas se você bebê-la sem estampar o que tem dentro dela, tudo estará bem. Neste caso, esporte e cultura não estariam ai se mesclando?
Pense noutro esporte americano: O Football, ou como simplesmente chamamos de futebol americano: Um esporte de força e rapidez. Isto não revelaria um pouco da cultura que gosta de ser troglodita, trombar e lutar? Não estaria aí a gênese da sede de domínio, e a intrepidez para brigar, características estas marcantes na cultura americana?
Pense ainda no basquete, esporte no qual eles possuem a supremacia sobre outras nações. Sem dúvida, não há competidor para o nível de técnica que eles possuem. Sua habilidade técnica e precisão é algo surpreendente. Não seria isto um traço do povo americano? Uma forma de pensar e agir? De construir grandes impérios, empresas e administrar a vida?
Bem, como estou aqui tentando escrever um ensaio um tanto quanto filosófico, deixe-me arriscar alguns palpites sobre o Brasil e sua relação de paixão com o futebol. Por que ele é tão popular entre nós? Porque o mundo fica tão embasbacado com a qualidade técnica de nossos jogadores? O futebol não revelaria um elemento também cultural?
Creio que sim. O que diferencia o futebol é sua ginga, sua malandragem, seu passo desconcertante, o jeito inesperado e diferente de fazer as coisas. É o jeitinho brasileiro, de sempre querer fazer que vai mas não vai, dar a impressão de que é mas não é? Lamento informar mas os nossos gordos congressistas parecem demonstrar toda esta habilidade para o drible, para a malandragem, para a ginga. Embora não o possam fazer isto fisicamente por causa de sua característica marcantemente obesa, o fazem com galhardia no que diz respeito à dignidade e ao bem público.

sexta-feira, 2 de junho de 2006

Violência e sociedade

Violência tem etiologia. Não surge num vácuo histórico, nem acontece do nada. Violência tem raiz, origem, umas averiguáveis, outras não claramente distinguíveis.
Rollo May trabalha este tema de forma muito madura em seu clássico livro “Eros e violência”, afirmando que a agressividade em geral está relacionada à impotência animal, quando estes se sentem desprotegidos, tornam-se agressivos. Assim, é que um animal acuado, encurralado ou em sofrimento, pode ter reações absolutamente estranhas. O filme “O Patriota” traça este perfil, na pele de um homem pacato que vendo seu filho sendo friamente executado, torna-se um monstro, e revela uma violência que ele mesmo desconhecia.
Leonardo Boff ainda articula um conceito amplamente discutido no campo comportamental que é a “violência dos violentados”. Para ele, esta seria a violência como resposta ou a violência reativa, que brota de ambientes hostis, e muitas vezes trata-se de uma questão até mesmo de sobrevivência para aqueles que a praticam.
Arnaldo Jabor em sua análise sobre o hediondo e lamentável incidente ocorrido em Brasília na invasão que o MLST fez ao Congresso Nacional no dia 06/06/2006, foi muito feliz na sua observação afirmando que o Legislativo violentou a nação absolvendo pessoas com práticas ilegais e suspendeu sanções sobre pessoas comprovadamente corruptas; o Judiciário zombou do povo ao permitir que reconhecidos criminosos tivessem o direito de “não responder” numa Comissão Parlamentar de Inquérito, e que o Executivo tratou com descaso os sucessivos escândalos engendrados na cozinha do Palácio fazendo de conta que isto não era com eles. Esta violência dos poderosos se materializa agora na violência dos impotentes e dos partidos marginais que articulam esta nova Guerra dos Farrapos.
Tudo isto nos ajuda a ler a história, fazer hermenêutica da violência, mas precisamos lembrar que a agressão, a balbúrdia e o caos precisam ser rigorosa e exemplarmente julgados. Explicar não é justificar. Se o país mais uma vez tratar com indulgência cenas de bandidagem vamos precisar explicar outra vez, num futuro breve, novas cenas de selvageria pública que eclodirão neste país de tanta violência social.
Esperamos ainda que não sejam julgados apenas aqueles que praticaram estes recentes atos de selvageria recentes em Brasília, mas em nome da justiça e em nome de Deus, que os crimes de colarinho brancos também levem para a cadeia aqueles que tem sistematizado, “pandemizado” e “endemizado” a corrupção, outra forma de violência tão conhecida em nosso país.

quarta-feira, 3 de maio de 2006

TRABALHO

Em torno da idéia do trabalho nasceram muitas piadas, uma delas diz: “na hora de comer, comer; na hora de dormir, dormir; na hora de trabalhar, pernas para o ar, porque ninguém é de ferro”. Uma outra é descrita assim: “Às vezes me dá uma vontade de trabalhar, aí eu fico quietinho até a vontade passar”.De fato, muita idéia errônea foi construída em torno do trabalho. Aristóteles chegou a afirmar que o trabalho deveria ser deixado para os escravos e este conceito penetrou no mente européia por anos, até ser desafiada pela Reforma no século XVI.
No entanto, a doutrina da criação, registrada inicialmente no livro de Gênesis, inclui dentre as tarefas humanas o trabalho, e isto antes da queda da Raça humana. Ainda no Éden Deus disse ao homem: “Tenham domínio sobre os peixes, sobre as aves, sobre os animais domésticos e selvagens e sobre os animais do campo” (Gn 1.26).
A idéia de domínio não era a de exploração, mas acima de cuidado e proteção. Ao homem foi dada a tarefa de dar nome aos animais e de cuidar do jardim (2.20-21).
Isto demonstra que o Trabalho não estava associado à maldição, mas como parte intrínseca da tarefa de ser gente, de expressar sua humanidade. “Este ensinamento percorre todo o Antigo Testamento e culmina em Jesus, que era um homem trabalhador antes de se tornar um pregador itinerante” (Samuel Escobar). O povo judeu tinha um provérbio que era repetido de pai para filho: “Quem não ensina ao seu filho uma profissão, faz dele um ladrão”.
Os males que rondam o trabalho devem ser avaliados e discutidos: Karl Marx denunciou o desequilíbrio econômico afirmando que a maior mazela social tem a ver com a exploração da classe burguesa ao desvalorizar o valor humano do trabalho. Marx se referiu ao conceito da “mais-valia” que se dá pelo fato do trabalhador não ser valorizado pelo que fez. Este princípio é profundamente atualizado ainda no nosso mundo carregado de injustiça e opressão contra o trabalhador.
A Bíblia também denuncia severamente o trabalho opressivo. Ela nos ensina que Deus ouviu o clamor dos israelitas escravizados no Egito. Tiago denuncia a exploração da mão de obra, e os baixos salários, de uma forma que nenhuma ONG poderia dizer de forma mais apropriada e contemporânea: “Eis que o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos e que por vós foi retido com fraude está clamando; e os clamor dos ceifeiros penetrou até os ouvidos do Senhor dos Exércitos” (Tg 5.4).
Tanto a Reforma religiosa do Século XVI, com João Calvino e Lutero, quanto os Puritanos, procuraram associar o trabalho à vocação, demonstrando que ele era um instrumento de benção, não de opressão. Esta visão ajudou a formar a sociedade industrial Européia.
Quando o trabalho encontra este sentido da sacralidade e é descrito com um bem supremo ou vocação as coisas passam a ser feitas com maior sentido, porque são realizadas antes de tudo para Deus. Se é dramática a situação brasileira com remunerações indignas, igualmente o é fazer o trabalho de forma negligente quando se lesa o empregador com uma baixa qualidade de atividade e descaso, mesmo quando se trata daquilo que é público. Por ser vocação o trabalho traz realização e nos torna plenos naquilo que fazemos.

terça-feira, 18 de abril de 2006

Liberdade autêntica

O evento Tiradentes é um dos marcos mais significativos na história brasileira sobre sua liberdade enquanto nação, muito mais importante, por exemplo, que a Declaração da Independência feita às margens do Ipiranga por D. Pedro I, que nada mais foi que uma saída honrosa, um arranjo político, para satisfação de pressões internacionais da Inglaterra, trazendo favorecimento financeiro aos poderes externos. O Dia da Independência, da forma romântica como nos é ensinada nas escolas é uma grande farsa. Quem declarou a independência foi o opressor, que continuou dominando sobre uma suposta nação livre. A situação foi tão flagrante que vários países da América do Sul, por anos, recusou a reconhecer esta farsa da independência realizada na Terra Brasilis.
O evento Tiradentes é diferente. Homens desejosos da liberdade deram, de fato, suas vidas, sacrificando-as em torno de um ideal, que era uma nação livre das ingerências da Coroa Portuguesa. Morreram em praça pública, como criminosos e rebeldes, tornando-se semente para a autonomia brasileira.
Isto nos direciona para a questão da liberdade. O que é, de fato, liberdade? O que leva homens a darem sua vida e a morrerem por ideal? Os dicionários muitas vezes definem liberdade em termos negativos: “Ausência de repressão, prisão” ou mesmo “o fato de não estar acorrentado, restringido no seu direito de ir e ver, de pensar e afirmar o que pensa”. Todas definições possuem certo aspecto negativo. O verdadeiro clamor por liberdade, contudo, é mais que um apelo para se ver livre da tirania, sendo também, um convite para uma vida plena de significado.
Michael Ramsey fez uma série de palestras para a Cambridge University (Londres, 1970) indagando: “Todos nós queremos o homem livre de alguma coisa, mas precisamos também perguntar, para que queremos liberdade”.
O que Ramsey advoga é que Liberdade absoluta e ilimitada, não quer dizer liberdade autêntica. Ele usa o exemplo do peixe. Deus o criou para viver na água. Sua estrutura é preparada para absorver oxigênio da água, por isto, o peixe só vai encontrar seu significado, sua identidade, sua plenitude, vivendo na água. Ele está limitado ao seu habitat, mas nele encontra verdadeira liberdade. Se ele resolve sair do aquário em que vive, buscando viver no carpete ou no concreto, sua atitude o leva para a morte, não para a liberdade.
Autêntica liberdade, portanto, é exatamente o oposto daquilo que muitos pensam. Não existe liberdade quando perco a interação e responsabilidade para com Deus e para com os outros. Isto é escravidão ao meu egoísmo, aos meus instintos e aos meus apelos interiores. Neste sentido, minha liberdade torna-se minha algema.
Verdadeira liberdade, portanto, alterna dois pólos: O negativo (liberdade de que?) com o positivo (liberdade para que?)
Desde que o homem faça o que está dentro dele, cometerá sempre pecado mortal… livre, ele é apenas para o mal”(Lutero). Agostinho finaliza dizendo: “O Livre arbítrio sem a graça apenas outorga poder ao pecaminoso”. Neste caso, não há autêntica liberdade, que deveria nos ensinar a amar, mas uma forma de escravidão que nos leva a viver egoisticamente. Alexander Soljenitsin, conhecido dissidente russo afirmou: “Quando você despoja um homem de tudo o que ele possui, ele já não está mais sob o seu poder. É livre de novo”. Este é o paradoxo da liberdade.

terça-feira, 4 de abril de 2006

O Problema do sofrimento e do mal

Numa palestra proferida na Harvard University em 2001, o Dr Billy Graham, falou sobre os grandes mistérios que ainda perduram na humanidade apesar de sua conquista tecnológica. Problemas espirituais que só podem ser resolvidos com respostas morais e espirituais: (a) O problema do Mal - Nosso século povoado de tragédias: Mortes, guerras, catástrofes. Como explicar o mal, em seu poder de mudar nossa história e sonhos? (b) O problema do sofrimento - Divórcio, orfandade, guerras, violência, destruição da família. Por que sofremos? (c) O problema da morte – Como explicar este fenômeno que é ao mesmo tempo tão natural e antinatural?
A Bíblia nos ensina que o universo foi criado de forma perfeita e harmoniosa, e que Deus considerou que tudo que havia feito era muito bom, mas o pecado entrou no mundo por causa do orgulho, rebeldia e das escolhas morais feitas pelo homem. A dor e o mal vieram como conseqüência, não faziam parte do plano original de Deus. “Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias” (Ec 7.29).
O mal, a dor e a morte não faziam parte do propósito original de Deus, mas são resultantes de conflitos morais e decisões erradas. Se formos honestos, veremos que muitos dos males que sofremos resultam de nossa atitude tola nas escolhas que fazemos e nas prioridades erradas que damos à nossa vida.
Jesus, contudo, não considerou o sofrimento de uma forma normal. Muitas vezes se sentiu indignado e entristecido diante do desprezo humano em relação à vida. Por duas vezes tentou tirar dos discípulos uma cosmovisão equivocada e cultural que tinham de associar a dor a um pecado especifico (Lc 13.1-5; Jo 9.1-4). Ao ministrar sobre este assunto, deixou claro que, o mal, nem sempre, é resultado de escolhas morais. Ele considerou o mal como algo anormal, e por isto não aceitou resignadamente a brutalidade e violência da vida. Chorou diante da morte, reagiu diante de atitudes de lideranças que impunham sofrimento aos seus liderados, curou leprosos, cegos e coxos, conspirando contra a angústia presente na vida humana.
A dor, o mal e a morte ainda continuam sendo filosoficamente desafiadores, às vezes ficamos perplexos diante de notícias estarrecedoras. Apesar de não entendermos a complexidade destes fatos, somos exortados a lutar contra toda forma de expressão, violência e anti-vida com a qual nos defrontamos. “Precisamos resgatar a capacidade de indignação e dor diante da miséria que assola a América Latina” (Oscar Bulhole). Devemos lutar contra toda expressão satânica ou humana do mal, da injustiça e da opressão, lembrando que “A religião pura e sem mácula para com nosso Deus e Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo” (Tg 1.27).
O mal não pode ser explicado em todas as suas dimensões, mas isto não pode levar-nos a uma atitude cômoda em não combatê-lo com a prática do bem. O mal e a dor podem não ser teologicamente explicados, mas devem ser confrontados com o exercício do bem e da promoção do Reino de Deus. Quando somos a vítima do mal, somos também desafiados a enfrentá-lo com coragem, fé e esperança. “Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (Rm 12.31).

quinta-feira, 30 de março de 2006

A Vingança do fracasso

O jornalista Henry Fairlie, no seu livro, os sete pecados mortais de hoje afirma que o lema de nossos dias poderia ser “A vingança do fracasso”. Segundo o autor, a miséria detesta solidão, ou, como é comum encontrarmos nos famosos ônibus londrinos: “misery loves company”.
Para Fairlie, quando os homens não conseguem fazer algo bem feito eles destroem novos paradigmas para enaltecer a mediocridade. Quem não consegue escrever bem, ridiculariza as formas e estilos, descarta o pensamento linear tornando-o irrelevante para construir aquilo que precisa ser valorizado. O mundo da arte está repleto destas tendências: Quando verdadeiras obras de arte não são produzidas, destrói-se os cânones da pintura e cria-se assim um novo universo. Por isto, sempre temos uma quantidade imensa de músicos, literatos e artistas ridículos que se fazem passar por gênios, quando na verdade são apenas simulacros da verdadeira arte. Esta é a vingança do fracasso!
Creio que com base neste argumento torna-se possível entender a arte brasileira: É impossível que um ouvido que se preza consiga ouvir determinadas músicas de sucesso, ler determinadas textos que se escrevem, acompanhar determinados veredictos de pequenos juristas que são feitos sem manifestar repúdio intelectual. Não dá para pecar contra o senso estético, artístico ou moral. É a vingança do fracasso! Parece que quanto mais tolo e mal elaborado for o conteúdo da questão, o ritmo e a poesia, maiores são as chances de se obter sucesso.
Isto ainda pode ser verificado nos programas de Televisão que atualmente ocupam nossos horários nobres atestando a ironia do que se convenciona chamar sucesso. Com frases repetitivas e idéias curtas, os programas de auditório se mantém com uma diarréia de palavras e uma constipação de idéias. Se você analisar o conteúdo do Faustão ou da Luciana Gimenez você se assusta, sem citar outros. Se você ficar na frente da TV assistindo estes programas mais do que cinco minutos, você estará passando um atestado de burrice a si mesmo e sofrerá um dramático processo, quase que irreversível, de emburrecimento e “asnificação”.
A razão? Fairlie pensa que isto é resultado de um igualitarismo corrupto de uma democracia de mente fraca. “Colocar os desiguais contra os desiguais como se fossem iguais é criar um berçário de fomentação de invejas... O que não conseguimos atingir, rebaixamos. O que exige treino e trabalho árduo nós demonstramos que poderá ser realizado sem esses esforços”.
É isto que vemos nos discursos populescos de políticos mal preparados, no ambiente cultural dirigido por medíocres, na corrupção do clero, nas colunas sociais recheadas de fofocas e que são mantidas na fogueira ridícula da vaidade. Deprecia-se o outro, e quanto maior ameaça ele representar mais será punido. É conhecido o caso de professores medíocres que negam informações preciosas a estudantes com medo da concorrência que sofrerão no futuro. Neste ambiente a inveja viceja, já que “inveja é a tristeza pelo bem do outro” (Thomas de Aquino).
Caetano Veloso em sua magistral poesia afirma o seguinte em podres poderes: “Será que nunca faremos senão confirmar, a incompetência da América Católica, que sempre precisará de ridículos tiranos?” É...parece que o fracasso tem conseguido ser vitorioso...

domingo, 19 de março de 2006

Certo e Errado

Vivemos dias de relativismo e subjetivismo moral. Segundo este princípio filosófico, não se pode afirmar que algo é certo ou errado, pois tudo é relativo, dependendo do ponto de vista de cada um: Se A é o oposto de B, e A é certo, nem sempre significa que B é errado. É possível encontrar uma síntese hegeliana que trata as coisas não numa perspectiva de tese e antítese, mas sim, de síntese. A verdade é individual. Não existe verdade objetiva, apenas a verdade de cada um (subjetiva). Ela não é mais o que a filosofia de Sócrates afirmou: “A verdade é o que é”, antes aquilo que se pensa ser, ou aquilo que se sente ser.
Diante disto, como saber se algo é certo e errado, se é que existe algo que possamos chamar de certo e algo que se possa chamar de errado? Se somos simples máquinas, ou “o resultado de colocações acidentais de átomos” (Russel), não há sentido falar de trevas e luz, nem de falso e verdadeiro.
O problema básico é que, ao afirmar isto, negamos a responsabilidade moral. Como definir o que é certo ou errado se tudo é relativo, até mesmo a afirmação “tudo é relativo”, que agora precisa também ser relativizada? No entanto, queremos estabelecer conceitos como justiça, honestidade, integridade, mas se estes critérios são subjetivos, é tolice dizer que algo é justo. Negar a distinção entre bem e mal, certo e errado, parece contrariar a base ética da humanidade.
C. S. Lewis, conhecido escritor britânico, afirma que quando uma pessoa reivindica algum direito, ela está apelando para algum padrão de comportamento, regra, lei ou moralidade, que ela espera que o outro conheça. Se não existe regra, não há sentido em reclamar de uma pessoa que toma o seu assento ou que estaciona na sua vaga de garagem. Quando protestamos inferimos que existe algo que é certo e por isto mesmo, algo que, sendo contrário, é errado. Não existe lógica reclamar se não existe uma regra entre o que é bom ou ruim, falso e verdadeiro. (Lewis, C.S, Mere Christianity, pg 19). É impressionante que, mesmo aqueles que afirmam não haver diferença entre certo e errado, minutos depois de se sentirem prejudicados venham a dizer, “isto não é justo!”
O cristianismo não sofre desta incerteza a respeito do bem e do mal. Isaias chega mesmo a afirmar: “Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal; que fazem da escuridade luz e da luz, escuridade; põem o amargo por doce e o doce, por amargo!” (Is 5.20). O cristão não tem dificuldade de afirmar que o mal e o bem existem e são excludentes.
O caráter de Deus torna-se referência para o comportamento humano. A Bíblia afirma, entre outras coisas, que Ele é misericordioso, bondoso, amoroso, santo e justo. Por isto, no dia do juízo final, atos, palavras e pensamentos serão julgados. Existe parâmetro de certo e errado para este julgamento. A verdade e a justiça serão estabelecidas, a despeito daqueles que tentam mesclar o certo e o errado dizendo que são a mesma coisa vista de ângulos diferentes.
Todos são criados com uma consciência moral que é a Lei de Deus, mesmo os pagãos mais remotos. “Os pagãos não tem a lei. Mas, quando fazem pela sua própria vontade o que a lei manda, eles são a sua própria lei, embora não tenham a lei. Eles mostram, pela sua maneira de agir, que tem a lei escrita no seu coração. A própria consciência deles mostra que isto é verdade, e os seus pensamentos, que às vezes os acusam e às vezes os defendem, também mostram isso” (Rm 2.14-15). Esta consciência, contudo, pode se tornar insensível e calejada. Por causa de nossas escolhas morais corremos o risco de nos acostumarmos com o mal. Mas é bom lembrar que a Lei Natural e a Lei de Deus clamam pela justiça, e que a despeito da tentativa de alguns de chamar certo de errado, e errado de certo, todos teremos um dia de comparecer diante daquele para quem bem é bom, e mal é mau. Luz é luz, e escuridão é escuridão!

quarta-feira, 8 de março de 2006

Decepcionado com Deus

No seu excelente livro Disappointment with God (Grand Rapids, MI, Zondervan Publishing house), Philip Yancey desenvolve uma discussão profunda sobre a questão do silêncio e mistério de Deus. Com muita honestidade ele faz três perguntas que ninguém gosta de fazer em voz alta.

1. Deus é injusto? Neste item ele discute a questão que muitas vezes paira na alma humana. Muitas pessoas encontram enorme dificuldade em conciliar sua tragédia pessoal, dor e culpa com a idéia de um Deus bondoso. C. S. Lewis, ao discutir o problema do sofrimento, faz uma síntese desta questão ao afirmar: “para muitos Deus é bom mas não é Todo Poderoso, ou Deus é Todo Poderoso mas não é bom”.

2. Deus é silencioso? Muitos vêem Deus como um poder frio e distante, mais ou menos como um dos deuses representados no panteão romano. Estes deuses eram alheios às dores dos mortais. Mesmo o salmista parece experimentar esta angústia ao afirmar: “Desperta Senhor, por que dormes? Levante-se! Não nos rejeites para sempre” (Sl 44.23-24).

3. Deus está escondido? Muitos acham que Deus se oculta nas horas de maior necessidade. Imaginam o universo governado por uma força impessoal, cega e fria, conduzida pelo sortilégio, fatalismo a acaso. Para estes, se é que Deus existe, Ele é uma força distante, cuja face não será jamais revelada.

Elie Wiesel, conhecido judeu que foi levado para os terríveis campos de concentração na Polônia, narra um intrigante e terrível incidente acontecido naqueles centros de tortura. Alguém teria roubado a cozinha da Gestapo e os soldados nazistas queriam punir exemplarmente o erro e então exigiram que o ladrão se pronunciasse. Como o culpado não se manifestou, eles pegaram um idoso e uma criança e os colocou do lado de fora do prédio para morrer de frio no rigoroso inverno do Norte da Europa. No outro dia, inexplicavelmente a criança ainda respirava agonizante quando uma mulher, diante daquela cena angustiante, começou a gritar desesperadamente: “Onde está Deus? Onde está Deus?” Então, um dos idosos do grupo veio, abraçou a mulher e lhe disse: “Deus está ali!”, e apontou para a criança. “Por que se Deus não estiver ali, ele não se encontra em nenhum outro lugar”.

Muitas vezes temos decepções com a vida e responsabilizamos Deus. Mas este Deus também experimentou a dor, ao assumir nosso lugar na cruz. Se Deus não esteve com Cristo, na hora do sofrimento por ele experimentado, Ele não poderia estar em nenhum outro lugar. Certamente os caminhos de Deus são misteriosos, mas ele ainda anda no meio de nossa tormenta e tempestade.

quinta-feira, 2 de março de 2006

A função do descanso para a alma humana

Em função do trabalho residi no Rio de Janeiro nos idos de 90 por quase cinco anos. Um amigo meu costumava afirmar que os dias de carnaval eram os melhores dias para ficar na cidade. Pode parecer brincadeira, mas nesta época do ano o trânsito fica tranqüilo, as praias pouco freqüentadas e o carnaval de rua praticamente inexiste, desde que o sambódromo foi criado.
Meu objetivo aqui, não é falar do carnaval, mas da importância do feriado para a psiquê e saúde humana, independentemente da época em que é comemorado. Quero resgatar o conceito do shabath na concepção judaica e sua atualidade para os dias de hoje.
O sábado, shabath, significava originalmente descanso. Ele foi instituído por Deus, e dado a Moisés, dentro do contexto da legislação mosaica, assumindo um importante papel na cosmovisão do povo judeu, sendo estabelecido como o quarto mandamento: “Lembra-te do dia de sábado para o santificar” (Ex 20.8).
Muitas pessoas desconhecem, mas o sábado não era apenas o sétimo dia da semana. Deus instituiu muitos outros sábados que eram festas fixas como a páscoa, comemorada no 14o. dia do mes de Abib e que portanto era celebrado como sábado, em qualquer dia da semana. Era festa de Shabath.
O sábado tinha alguns objetivos específicos:
1. Era usado primariamente para glorificar a Deus – Neste dia o povo judeu aproveitava a oportunidade para agradecer a Deus, reunir-se com a família e ouvir a leitura da Torah feita nas sinagogas que eram constituidas com o mínimo de 10 judeus do sexo masculino, incluindo crianças acima de 13 anos de idade. O quarto mandamento afirmava que o povo deveria se lembrar do sábado para o santificar. Reservava-se esta data para se aproximar do criador e agradecer o seu cuidado;
2. O sábado era usado também com uma função social – Nem o escravo, nem o forasteiro, nem os animais, deveriam trabalhar neste dia, nem mesmo o jumento. Como Deus sabe do poder que a ambição e o lucro exercem na alma humana ele proibiu que escravos fizessem qualquer atividade neste dia. Isto tinha um benefício social e atingia de forma direta os pobres e discriminados socialmente. O sábado detinha a ganância e a mentalidade de lucro e ganho, protegendo os fracos.
3. O sábado tinha a funcão de equilibrar a mente e o corpo – além das duas razões anteriores, Deus também estava pensando na necessidade que nosso organismo tem de parar as atividades para equilibrar corpo e mente. Sossegar. Não fazer nada. “Em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou” (Ex 20.11).
Jesus posteriormente vai clarificar ainda mais este conceito, mostrando que Deus não estava preocupado consigo mesmo ao estabelecer o sábado, nem com o sábado em si, como uma corrente legalista quis fazer. Por isto afirma: “o homem não foi feito por causa do sábado, mas o sábado por causa do homem”. Deus não precisava do shabath, mas queria nos ensinar o valor do descanso para nossos corações. Portanto, o sábado tem uma função sacramental. Tolo é o homem que não consegue descansar para fazer aquilo que sente prazer em fazer. Ao criar o sábado, Ele queria nos ensinar que o descanso tem uma função espiritual para o ser humano.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

A Universalidade da Fé

Todos cremos em alguma coisa. Religiosidade e credulidade são coisas próprias da raça humana. Carl Gustav Jung, famoso psicólogo desenvolveu a tese do arquétipo humano ou inconsciente coletivo, segunda a qual, todos os seres humanos teriam introjetados em si determinados conceitos culturais e universais e um destes seria Deus.
Nenhuma sociedade humana, exceto o modernismo, com o princípio fundamental da razão acima de todas as coisas, ousou prescindir a idéia de Deus. O resultado foi interessante, porque enquanto Nietzsche proclamava a morte de Deus, uma chuva de outros deuses desceu sobre a humanidade, e um dos conceitos característicos da pós-modernidade é o da espiritualização. Os homens estão cada vez mais fascinados pelo místico e sobrenatural, algumas vezes com grandes prejuízos para si mesmos, porque enveredam por caminhos absolutamente desconhecidos e por fronteiras do inimaginável, de onde, muitas vezes, não se tem condições de retornar com sanidade mental.
Bem já dizia Mário Quintana no seu pequeno verso a grande surpresa: "Mas que susto não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo..." (Caderno H)
Fé significa fundamentar a vida num fundamento fora de si mesmo”. Segundo Rubem Alves, “mesmo na ciência não se pode ir para a frente sem o risco da fé a uma visão de esperança” (R. Alves, o enigma da religião, pg. 136). Assim, segundo Alves, “estamos condenados à religião. Não se pode viver por certeza, mas por visões, riscos e paixões. É provável que nos envergonhemos disto e que vistamos nossos valores e sonhos com as vestes da ciência” (Rubem Alves, o enigma da religião, Pg. 137), mas “todos aqueles que tiveram que criar, tiveram seus sonhos proféticos e sinais astrais - e fé na fé” (R. Alves, O enigma da religião, pg. 137 citando Niestzsche).
“Não cremos porque chegamos a uma conclusão... Ou porque fomos vencidos por alguma emoção. É uma transformação dentro da mente causada por um poder que está acima da mente, uma colisão com o inacreditável que nos força a crer” (Abraham J. Heschel - O homem não está só, pg. 79).
Basta sermos humanos para crer. Todos cremos em alguma coisa. Os pagãos constroem seus templos e os ateus glorificam seus deuses, criados à sua própria imagem. Aliás, este é o conceito fundamental de um ídolo: Uma idéia, ou deus, ou santo que construo à minha imagem e semelhança, mas ainda assim, constituo-o no meu deus, com todos vícios e defeitos imanentes em mim mesmo.
A maioria de nós é capaz de dizer o que pensa a respeito da sociedade, da ordem, da política e da lei, mas estes pensamentos são construídos não dentro de um vácuo, mas dentro de um sistema de crença que consideramos valioso, por isto, os homens se parecem com seus deuses.
Pessoas que crêem num Deus duro e inflexível tendem a se comportar de forma legalista e acusatória com os outros – reproduzem assim seu conceito de Deus. Pessoas com um conceito de um Deus amoroso, tendem a construir relacionamentos também fundamentados no amor. Não é de se admirar que no Islamismo o conceito de Deus como Pai não exista. Alá é forte, poderoso, soberano, mas Alá não é Pai.
Jesus, no entanto, ao se referir ao seu Pai, o chama escandalosamente de paizinho (A expressão Aba Pai, que ele emprega tem esta conotação). Alguém carregado de afeto, onde podemos reclinar nossos ombros e dormir despreocupadamente.
Nenhum homem é maior que seu Deus. Sua divindade determina seu caráter. Falando nisto, se você não sabe ainda qual é o seu Deus, pergunte a si mesmo: "A quem tenho amado, temido e servido mais do que Deus?". Este é o seu ídolo, mas também este é o seu Deus.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006

“Não furtarás”-Oitavo Mandamento

Existe muita variação desta temática nos dias de hoje. Certamente achamos que não roubamos, mas quando analisamos de forma mais profunda este mandamento é bom ficarmos atentos para suas implicações. Antes de mais nada, porque ele não fala diretamente de roubo, mas fala de furto.
Qual é a diferença entre roubo e furto? Roubar é algo agressivo, frontal, direto. É tirar de forma objetiva das mãos do outro aquilo que lhe pertence. Furtar já indica alguma coisa mais sutil, furtiva, escondida, camuflada.
Todas culturas possuem pecados endêmicos, difíceis de serem curados, que passam de uma geração para outra. Em muitas destas culturas, os conflitos raciais e/ou religiosos, valores perniciosos são transmitidos sem que, aparentemente, seja possível serem reparados. É um legado maligno. Gerações inteiras sofrem deste mal que tende a se repetir e a perpetuar como se fosse um estigma.
Na sociedade brasileira, existe uma pandemia destrutiva chamada corrupção. Ela se institucionaliza, se populariza, vem se perpetuando de geração para geração e de repente parece que a coisa tem que ser assim mesmo. Achamos que temos o direito de lesar: O governo lesa o cidadão com altos impostos, e o cidadão lesa o Estado com fraude e com sonegação. O político se julga no direito de furtar, o funcionário de lesar o seu patrão, sendo este público ou privado. O pecado cultural de nossa sociedade brasileira é o furto!
Reter o salário dos trabalhadores, impedir o acesso à terra para produção, falsificação de documentos, subornos, roubos baseados em nossa ganância, leis opressivas e impostos achacadores, atentam contra o direito e ferem o oitavo mandamento.
“Os pecados proibidos no oitavo mandamento, além da negligência dos deveres exigidos são: o furto, o roubo de homens e o receber qualquer coisa furtada; o tráfico fraudulento, pesos e medidas falsas, o remover marcos de propriedades, a injustiça e a infidelidade em contratos entre os homens ou em administrar negócios de outrem à nós confiados; a opressão, a extorsão, a usura, as peitas, as vexatórias forenses, todo o cerco injusto de propriedades e despejo injusto de inquilinos, a acumulação de gêneros para encarecer os preços, os meios ilícitos de vida, e todos os outros modos injustos e pecaminosos de tirar ou reter de nosso próximo aquilo que lhe pertence, ou de nos enriquecer a nós mesmos, a cobiça, a estima e o amor desordenados dos bens mundanos, os cuidados e esforços receosos e demasiados em obtê-los, guardá-los e usar deles; a inveja da prosperidade de outrem; assim como a ociosidade, a prodigalidade, o jogo dissipador e todos os outros modos pelos quais indevidamente prejudicamos o nosso estado exterior; e o defraudar a nós mesmos do devido uso e conforto da posição em que Deus nos colocou” (Catecismo Maior, & 142).
Num excelente romance de Hosseini, “o caçador de pipas”, ele faz uma afirmação muito importante: “Existe apenas um pecado, e esse é roubar, porque os outros são simplesmente variações do roubo (...) Quando você mata um homem, está roubando a vida. Está roubando da esposa o direito de ter um marido, roubando dos filhos um pai. Quando mente, está roubando de alguém o direito de saber a verdade. Quando trapaceia, está roubando o direito a justiça. Entende?”.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

Revelação e razão

Uma das questões filosóficas e teológicas clássicas na história da humanidade é o papel da revelação e razão no saber humano. Seria possível conhecer, apreender, através de um saber intuitivo e místico que vá além da razão? Isto é, seria possível que forças sobrenaturais nos revelassem verdades que a mente não seria capaz de abstrair?
Na linguagem de Brown, revelação significa o que Deus falou acerca de si mesmo; refere-se ao fato de que o metafísico apresenta verdades que de outro modo não seriam conhecidas. A razão, é o processo de alcançar uma compreensão a partir de fatos e declarações que passam pela epistemologia e podem ser objeto de discussão lógica, e que desta forma poderia ser transmitida a outras pessoas.
Pensando em revelação, três questões são essenciais. A fundamental é: "será que Deus se comunica ou tem interesse em falar conosco?" A segunda: "se Deus fala, é possível saber o que e quando?" A terceira: "se Deus fala, não seria interessante procurar ouvi-lo?"
Existe uma diferença sutil entre o pensamento do ateu e do agnóstico. O ateu afirma: "Não há Deus!", portanto, esta hipótese filosófica não existe. O mundo assim seria entregue à sorte e a azar, sendo um subproduto do acaso. Não há providência, nem teleologia, a história seguiria um movimento cíclico e espiral, sem nenhum propósito maior a não ser repetir-se indefinidamente.
O Agnóstico diz: "Deus existe, mas ele é um poder frio e silencioso". Um ser distante. Portanto, apesar de sua realidade ontológica, ele não interfere no curso da história, não ouve orações, não possui identificação com a humanidade sendo alheio às suas dores, aflições e angústias e, por isso, continuamos no vácuo de nossa fútil existência histórica.
O pensamento cristão afirma que Deus existe e que oração é um poder revolucionário, transformador, já que se dirige ao trono daquele que governa todas as coisas. Assim, "orar é perigoso", como disse o teólogo alemão Emil Brunner. Deus ouve, vê, julga os oprimidos, e apesar da aparente vitória dos ímpios, ele vai julgar a terra, indivíduos e nações. O cristianismo afirma também que Deus falou na história, muitas vezes, aos pais, pelos profetas, e que nos últimos dias nos falou por meio de seu filho Jesus (Hb 1.1-3).
Revelação é uma linguagem cristã. Deus não apenas existe, mas ele interage na história geral e particular. Ele se revela, habita num alto e sublime trono, mas participa de nossas lágrimas, ouve nossas orações e atende aqueles que clamam por sua ajuda, trazendo salvação, restaurando o cansado, renovando as forças do aflito.
A razão, sem a revelação, torna-se um saber incompleto, vê apenas um lado da vida, sendo limitado para lidar com questões que exigem respostas aos arquétipos e ao sentido da vida humana. Perder a dimensão da revelação é olhar para a vida sob uma única perspectiva. Conhecer a Deus e ser conhecido por ele faz uma enorme diferença na apreensão do saber.
Há muito saber não acessível à razão: saber intuitivo, místico, sobrenatural, emocional. Por isto o apóstolo Paulo falava: "cantarei com o espírito, mas também cantarei com a mente". Articular esta ponte entre a lógica humana e o saber revelado, poderia ser algo revolucionário em nosso ser interior.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2006

O homem invisível

Um dos maiores problemas do ser humano é o sentimento de exclusão e indiferença. Nada pode ser mais cruel para a alma que o descaso e o abandono. Jean Paul Sartre, um dos pais do existencialismo francês afirmou: “Se não nos olham, secamos”.
Esta é a temática recente de um texto de Gilberto Dimenstein, conhecido articulista da Folha de São Paulo, no seu livro com título despretensioso e vago, “O Mistério das Bolas de Gude” (Papirus), no qual narra histórias de invisibilidade e encantamento.
Este é o seu terceiro livro de reportagens, em que registra casos de pessoas excluídas da sociedade e que foram “despertadas” passando a estabelecer uma relação de pertencimento com o mundo. Para ele, a invisibilidade é a principal causa da violência, maior ainda do que a pobreza. “O que gera a violência é a sensação de não ter conhecimento, de não pertencer a sociedade”. A tese é corroborada por casos documentados em 16 anos de investigação jornalística.
Dimenstein afirma que em Nova York, capital onde viveu por três anos, assistiu a uma série de iniciativas de inclusão social que reduziram a violência. “Não era apenas só dar grana, era oferecer meios para as pessoas se expressarem por meio da dança, da música, da poesia, do esporte”.
Um dos fantasmas presentes ao homem urbano é o do anonimato. Você pode viver ao lado de pessoas com as quais você nunca conversa. Ter um apartamento que percebe ruídos do outro lado e nem ainda assim saber que face têm os seus vizinhos e muito menos identificar suas dores e dilemas. Vivemos sós em grandes cidades, trabalhamos compartimentalizados e segmentados. Isto traz outras crises de alma como a despersonalização e alienação.
É o fenônemo da invisibilidade. Não ser percebido pelo outro e não ter alguém que nos olhe. A necessidade de sermos vistos é tão grande que certas crianças provocam em seus pais diferentes atitudes de irritabilidade para chamar-lhes atenção, ainda que isto lhes cause alguma dor e disciplina. A punição assim torna-se uma reação neurótica, mas ainda preferível à indiferença e ao abandono psicológico.
Jung afirmou que “o vazio é a maior neurose da humanidade”. Este vazio pode perfeitamente ser identificado com esta ausência de sentidos e de significados, um relacionamento de excluídos, a invisibilidade. Todos nós precisamos estabelecer uma relação de pertencimento com o mundo e com o cosmos.
Gostaria de concluir esta questão, analisando o que se convencionou chamar de “vazio cósmico”. Neste caso, a invisibilidade encontra matizes na relação com o universo e com a sacralidade humana. Muitos de nossos conflitos poderiam ser resolvidos se, ao menos, pudéssemos entender que o nosso cósmico não é impessoal, vazio e frio, mas que ele possui uma referência a-histórica e sobrenatural em Deus. A Bíblia sugestivamente afirma: - “Este é o Deus que vê”. Esta percepção se deu na alma de Hagar, mãe de todos árabes, quando fugia abandonada e julgando-se invisível no meio do deserto, sem rumo e sem direção. Aquela percepção espiritual transformou sua história e tem trazido sentido à milhares de pessoas ainda hoje. Entender existencialmente que Deus é mais que algo institucional,que é alguém pessoal, que nos conhece e sabe quem somos altera toda nossa cosmovisão, nossa forma de ser e nossa interpretação da vida.

A COSMOVISÃO CRISTÃ

Todos nós temos uma cosmovisão, embora nem sempre estejamos conscientes disto ou talvez não entendamos corretamente o significado deste termo.

Cosmovisão tem a ver com a forma que lemos e interpretamos os valores, sistemas, crenças, ética, etc., isto é, o jeito de encarar a vida. Cosmovisão precede atitude, comportamento, relacionamento e afeta todas as nossas decisões.

A cosmovisão do homem está intimamente ligada à sua religião. Alguns são ateus dizendo-se cristãos: sua forma de ler, ser e interpretar a vida não tem absolutamente nenhuma correlação com o pensamento cristão, ou seja, aquilo que Cristo ensinou, professou e viveu. Por isto Ghandhi afirmou, para grande espanto da cristandade, que amava o Cristo que pregávamos, mas odiava o cristianismo que vivíamos.

Muitos que se dizem cristãos são ateus na prática. Outrossim, tenho visto alguns que declaram ateus, mas não conseguem desvencilhar-se dos princípios cristãos. Certamente Jesus repudiaria boa parte do cristianismo superficial que vivemos, aliás, certa feita afirmou que muitos dos seus pseudo discípulos o chamavam de Mestre, mas não faziam o que ele mandava.

"A melhor maneira de...analisar o cristianismo é olhar para Jesus Cristo" (Colin Chapman).

A pessoa histórica de Jesus de Nazaré é o ponto de partida de toda cosmovisão cristã. Nele, os cristãos encontram o paradigma de tudo o que se deve crer e o que se deve praticar. A espiritualidade cristã é cristológica. Resta perguntar como era este Jesus?

1. Revelou o mistério sem perder a dimensão da humanidade. Jesus não tinha medo da verticalidade da experiência religiosa: orava, jejuava, praticava exercícios devocionais, mas também não era alienado da história humana: estava envolvido com o que sofre, com o pobre, com o marginalizado. Basta ler o evangelho para perceber isto;

2. Articulou o natural com o espiritual, fez a ponte entre o humano e o divino. Era ao mesmo tempo alguém que experimentava a realidade de Deus, mas que nunca se distanciou de gente ferida, tanto que optou por morar no meio dos desprezados galileus. Na sua forma de praticar a espiritualidade, participou politicamente de seu tempo, exerceu seu mandato cultural, sua cidadania, fez crítica aos poderosos insensíveis de seu tempo, mas ainda assim, encontrou espaço e significado na relação com Deus, o Pai. Sua espiritualidade não era ativista.

Concluindo afirmaria que se nossa cosmovisão é cristã, não deveríamos, em hipótese alguma, sob risco de fragmentar a estrutura de nossa fé, deixar de olhar para a intrigante pessoa de Jesus de Nazaré. Nele encontramos o significado maior de viver, ler e interpretar a vida. Jesus nos ensina a ser humano, no sentido mais pleno desta palavra.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

O DESAFIO DA GRATIDÃO

Uma das coisas mais benditas da vida é aprender a viver uma vida de gratidão. Norman Vincent Peale certa vez afirmou que: "ser agradecido faz todas as coisas melhores".
Tenho observado que aqueles que desenvolvem a arte de agradecer como uma prática diária, são aqueles que conseguem viver uma melhor qualidade de vida. São mais efetivos e mais alegres. O ser humano não é naturalmente agradecido. Gratidão é uma arte...O ser humano tende a ser mais crítico e negativo. Temos mais facilidade de maldizer que abençoar, de reclamar que bendizer, de depreciar que apreciar. Experimente sentar um dia e no meio da roda de amigos recusar a falar mal de uma família ou de uma pessoa, mas encontrar nelas coisas positivas. Você vai ver como é difícil. Pode soar até mesmo anacrônico. No entanto, gratidão é uma atitude que precisamos cultivar.
Vamos fazer de contas que você decida passar um dia agradecendo. Isto pode ser mais difícil do que você imagina. Então quando você acorda, percebe que está caindo uma chuva torrencial lá fora, você precisa ir para o trabalho, e então diz: “Obrigado Deus por este dia, eu te agradeço pela chuva, pelo mistério que existe nela, pela forma como o Senhor faz todas as coisas certas. Eu te agradeço, porque ao vê-la eu percebo que o Senhor nos dará uma estação frutífera. Eu quero te louvar por este dia”.
Olhe para seu filho e diga: “Senhor, obrigado pelo meu filho, eu quero te louvar pelo que ele é. Me ajude neste dia a ser mais paciente e amoroso com ele, dá-me mais capacidade de discipliná-lo em amor, de ser capaz de perceber as dificuldades de seu crescimento. Eu quero te agradecer por isto”.
Se sua esposa estiver ainda dormindo, chegue até sua cama e diga: “Senhor, eu quero te agradecer por minha esposa, muitas vezes eu não consigo entendê-la, muitas vezes as coisas se tornam difíceis na nossa relação, mas eu entendo que o Senhor nos tem dado um para o outro para cuidar e proteger um ao outro. Obrigado Senhor por sua vida”. Dar um beijo no seu rosto e dizer baixinho: “Eu te amo!” Estas coisas fazem diferença ou não?
Conheci uma pessoa que tinha sem perceber o vício de reclamar: Certo dia sua esposa lhe disse: “benzinho, você tem reclamado demais, Deus tem sido bom para conosco”. E ele respondeu: Ah! Não é tanto assim...” Então ela para convencê-lo de que estava certa disse.“Vamos fazer uma aposta neste dia, quem reclamar de qualquer coisa vai pagar um real para o outro?". No final do dia ela lhe trouxe a conta: Ele reclamara nada menos que 33 vezes apenas naquele dia.
Norman V. Peale disse certa vez: “É estranho, mas aparentemente fundamental na vida humana, que quando você guarda as bençãos em sua mente, você tende a crescer com elas, e elas crescem quando você as recorda”. Você realmente traz circunstâncias favoráveis e melhores condições para sua vida, por pensar naquelas bençãos que já são suas. Marco Aurélio, pensador Romano já falava há muitos anos atrás que “o mundo no qual nós vivemos é feito daquilo que pensamos”. Deprecie sua condição de vida no pensamento e suas bençãos tenderão a encolher e a se tornar menores em número. Aprecie mentalmente as coisas, e a vida crescerá brilhante e atraindo coisas melhores.
Uma das tragédias da natureza humana é a lacuna de interesse que temos em valorizar coisas simples e nosso fracasso em apreciar as coisas e pessoas. Chesterton disse: “Agradeço sempre àquele que todos os dias põe em nossos sapatos um maravilhoso par de pés”.
“Agradeçamos a Deus, porque ele é bom e sua misericórdia dura para sempre”.

terça-feira, 10 de janeiro de 2006

GRATIDÃO

Uma das coisas mais benditas da vida é aprender a viver uma vida de gratidão. Norman Vincent Peale certa vez afirmou que: "ser agradecido faz todas as coisas melhores".
Tenho observado que aqueles que desenvolvem a arte de agradecer como uma prática diária, são aqueles que conseguem viver uma melhor qualidade de vida. Eles são mais efetivos e mais alegres. O ser humano não é naturalmente agradecido. Gratidão é uma arte...O ser humano tende a ser mais crítico e negativo. Temos mais facilidade de maldizer que abençoar, de reclamar que bendizer, de depreciar que apreciar. Experimente sentar um dia e no meio da roda de amigos recusar a falar mal de uma família ou de uma pessoa, mas encontrar nelas coisas positivas. Você vai ver como é difícil. Pode soar até mesmo anacrônico. No entanto, gratidão é uma atitude que precisamos cultivar.
Vamos fazer de contas que você decida passar um dia agradecendo. Isto pode ser mais difícil do que você imagina. Então quando você acorda, percebe que está caindo uma chuva torrencial lá fora, você precisa ir para o trabalho, e então diz: “Obrigado Deus por este dia, eu te agradeço pela chuva, pelo mistério que existe nela, pela forma como o Senhor faz todas as coisas certas. Eu te agradeço, porque ao vê-la eu percebo que o Senhor nos dará uma estação frutífera. Eu quero te louvar por este dia”.
Olhe para seu filho e diga: “Senhor, obrigado pelo meu filho, eu quero te louvar pelo que ele é. Me ajude neste dia a ser mais paciente e amoroso com ele, dá-me mais capacidade de discipliná-lo em amor, de ser capaz de perceber as dificuldades de seu crescimento. Eu quero te agradecer por isto”.
Se sua esposa estiver ainda dormindo, chegue até sua cama e diga: “Senhor, eu quero te agradecer por minha esposa, muitas vezes eu não consigo entendê-la, muitas vezes as coisas se tornam difíceis na nossa relação, mas eu entendo que o Senhor nos tem dado um para o outro para cuidar-nos e proteger-nos. Obrigado Senhor por sua vida”. Dar um beijo no seu rosto e dizer baixinho: “Eu te amo!” Estas coisas fazem diferença ou não?
Conheci uma pessoa que tinha, sem perceber, o vício de reclamar: Certo dia sua esposa lhe disse: “benzinho, você tem reclamado demais, Deus tem sido bom para conosco”. E ele respondeu: Ah! Não é tanto assim...”Ela para convencê-lo de que estava certa disse.“Vamos fazer uma aposta neste dia, quem reclamar de qualquer coisa vai pagar um real para o outro?". No final do dia ela lhe trouxe a conta: Ele reclamara nada menos que 33 vezes apenas naquele dia.
Norman V. Peale disse certa vez: “É estranho, mas aparentemente fundamental na vida humana, que quando você guarda as bençãos em sua mente, você tende a crescer com elas, e elas crescem quando você as recorda”.Você realmente traz circunstâncias favoráveis e melhores condições para sua vida, por pensar naquelas bençãos que já são suas. Marco Aurélio, pensador Romano já falava há muitos anos atrás que “o mundo no qual nós vivemos é feito daquilo que pensamos”. Deprecie sua condição de vida no pensamento e suas bençãos tenderão a encolher e a se tornar menores em número. Aprecie mentalmente as coisas, e a vida crescerá brilhante e atraindo coisas melhores.
Uma das tragédias da natureza humana é a lacuna de interesse que temos em valorizar coisas simples e nosso fracasso em apreciar as coisas e pessoas. Chesterton disse: “Agradeço sempre àquele que todos os dias põe em nossos sapatos um maravilhoso par de pés”.
“Agradeçamos a Deus, porque ele é bom e sua misericórdia dura para sempre”.