segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Sacralização do profano



No artigo anterior analisamos os riscos da dessacralização do Sagrado, agora queremos considerar o inverso: o risco de sacralizar o profano.

Sacralizar o profano é considerar divino o que não é. É chamar bem de mal, mal de bem; amargo de doce e doce de amargo; fazer da escuridão, luz e da luz, escuridão como advertiu o profeta Isaias. Nada pode ser tão pós-moderno que esta dialética perversa. O relativismo moral e espiritual insiste em ser o que não é, e não ser o que é, desembocando inexoravelmente na perversa síntese hegeliana e malthusiana.

Deus disse a Pedro. “Não consideres impuro aquilo que eu já purifiquei”. Hoje o alerta precisa ser inverso: Não sacralize aquilo que é errado, não encontre nomes bonitos para coisas feias, não transforme o não-natural naquilo que é natural, não confunda Deus com o diabo, nem tente tratar o diabo como Deus.
O marketing tem facilidade para distorcer percepções e valorizar o que é inútil. Transformar conceitos verdadeiros em mentiras é uma prerrogativa luciférica. É assim desde o Éden. “É certo que não morrereis. Deus não está bem intencionado, Ele mente. Ele sabe que, no dia em que comerem do fruto, sereis como ele, conhecedores do bem e do mal. Podem pecar que não há conseqüência”. Satanás engana. Faz parecer bom o que é mal, inverte valores e desvirtua a pureza. Não sacralize atos perversos e nem tente dar uma roupagem divina ao diabo. Não transforme a ética depravada em comportamento amoroso e legítimo.

Não só pessoas seculares fazem isto. Religiosos tem mania e obsessão por esta inversão. Dão caráter santo ao que não é santo. Tentam vender o poder de Deus envasado em invólucros de águas bentas, águas sagradas do Rio Jordão ou lencinhos ungidos de auto denominados apóstolos. Transformam madeiras envelhecidas em relíquias terapêuticas, associam eventos comuns a realidades sobrenaturais, sacralizam locais e estruturas dando um caráter santo àquilo que é essencialmente neutro. Fazem romarias para transformar lugares comuns em templos sagrados e lugares da presença e manifestação de Deus, iludindo e confundindo sinceros, desesperados e ingênuos fiéis com maquiagens e roupagens eclesiásticas.

Atribuir caráter místico e esotérico àquilo que é comum é tão vazio e sem efeito como tentar transformar uma pessoa em monge porque vestiu o hábito. Não adianta atribuir sacralidade na esperança de que Deus aprove o gesto. Arão, irmão de Moisés, pediu ouro das pessoas que vieram do Egito para fazer um bezerro de ouro, e declarou que aquele objeto sagrado agora era divino. Não funcionou. O bezerro de ouro era um ídolo, e Moisés o destruiu ao descer da montanha onde recebeu as tábuas da Lei.

Não se sacraliza o profano. Uma ética profana, uma conduta inadequada, um gesto espiritualizado, ainda que venha numa justificativa filosófica e sofismática não muda a realidade daquilo que é essencialmente mal. Pessoas incautas e ingênuas podem até se render a esta roupagem supostamente divina e reverenciá-la, mas atribuir beleza e sacralidade ao mal, nunca foi sensato.




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