quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A violência Silenciosa



O Brasil tem a fama de ser um povo pacato, que não gosta de brigas, cordato, gente boa. Nem a “independência” de Portugal foi feita com sangue e suor como os outros povos, mas através de conchavos, negociatas de imperadores e transações comerciais nesta trama pavorosa. Contudo, os números recentes sobre homicídios no Brasil não apontam na direção de um povo pacato, mas de uma sociedade silenciosamente violenta.
O anuário brasileiro de segurança pública trouxe dados aterradores sobre 2012. Nada menos que 50.180 crimes violentos e letais, entre eles, homicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte foram cometidos, de acordo com a estatística oficial. Isto sem contar os 19.209 homicídios culposos no trânsito; 190.322 roubos de veículos; 1.087.059 roubos em geral e 50.617 estupros (18% a mais que 2011).
Nossos indicadores econômicos estão melhorando, mas a violência não diminui. Sem falar das formas sutis de violência como o machismo, o desrespeito aos pobres e idosos, a violência no trânsito. Toda esta situação aponta para o coração humano: Alguma coisa não vai bem com a alma humana. Temos uma tradição de passividade e sossego, mas estamos em guerra no coração, e isto se reflete nos relacionamentos. A violência não é um ato fortuito, acidental e gratuito. Precisamos ter “cuidado com a paz armada e a guerra fria”.
Em 1992 Arnaldo Jabor publicou o ensaio “O Brasil choca o ovo da jibóia” (Jornal Folha de S. Paulo 1/11/92) Nele afirma que “A riqueza não olha a miséria, mas a miséria olha a riqueza”. Jabor faz o elogio dos meninos do arrastão que estariam indo à luta, querendo melhorar o Brasil, o Brasil deles. Afirma ainda que “há um outro Brasil, um Brasil de psicanalistas, artistas, filósofos, que vive abstratamente do mal-estar da impossibilidade”. Para Jabor, Brasil concreto é menino cheirando cola na Praça da Sé.
O fenômeno do Black block, dos mascarados na rua demonstra esta violência interior. Neste movimento temos um misto de protesto, criminalidade e baderna e isto revela a desesperança e frustração presentes. É uma forma severa de violência. Boa parte não sabe sequer porque se quer lutar, apenas deseja lutar.
A violência assume roupagens complexas e se manifesta de forma brutal. Ela revela a fragmentação das famílias, a ausência de parâmetros e relações significativas; a brutalidade de um “embargo infringente”, ou “embargo indecente”. A violência se constrói numa sociedade de desigualdades e na perda de referências éticas, familiares e espirituais. Em 1933, em resposta a uma carta de Einstein, Freud escreveu em Por que a guerra: “a guerra nos despoja dos acréscimos ulteriores da civilização e põe a nu o homem primitivo que há em cada um de nós”.

No Brasil de hoje, com este número alarmante de homicídios, arrastões, depredações e saques, não estaríamos assistindo a uma busca desesperada e maciça de apropriação de algo próprio, de uma identidade perdida? Uma busca por um sentido maior, que preencha a difusa angústia da alma? Um simbólico? Por um ponto infinito que em última instância se chama Deus? 

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