quinta-feira, 18 de março de 2021

O Uso Legítimo da Lei




No meio de toda gravidade da pandemia que o Brasil enfrentou esta semana, com a média do número de mortes por covid-19 chegando a dois mil casos, outro assunto se transformou em manchete e ocupou o noticiário: a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin de anular as condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos processos da Operação Lava Jato. 

A decisão concede direitos políticos ao petista, tornado-o novamente elegível. As condenações foram anuladas sob a alegação de que não é de competência da Justiça Federal do Paraná decidir sobre os casos do sítio de Atibaia, do triplex do Guarujá e do Instituto Lula. O processo agora será analisado pela Justiça Federal do DF. Ao mesmo tempo, iniciou-se um processo de julgamento da suspeição do Juiz Sérgio Moro sob a alegação de que suas sentenças tiveram motivação política, sem a isenção necessária a um magistrado. 

Expectadores que somos, sem conhecimento profundo da lei, enxergamos as narrativas do lado externo e tentamos sintetizar tudo o que está acontecendo em nosso País, mas ficamos confusos e indagamos sobre a isenção dos juristas, seus interesses políticos e pessoais em todos esses trâmites. Se a acusação de suspeição paira sobre o juiz Sérgio Moro, quem poderá julgar se não pairam as mesmas acusações sobre a suprema corte brasileira?  

A célebre frase de autoria incerta “Aos amigos tudo, aos inimigos a lei” revela que a lei pode ser instrumentalizada e manipulada para dar o sentido que se deseja, sendo usada não só como instrumento punitivo, mas também para criar uma esfera de proteção por meio de casuísmos, algo conhecido como o utilitarismo legal. A lei é justa e imprescindível ao exercício pleno da cidadania, mas um competente e inteligente jurista, com alguns arranjos e distorções gramaticais, pode esquivar-se da necessidade de cumpri-la, usando-a contra seus desafetos. E isso, com a adoção de meios legais para receber benefícios pessoais. 

A Bíblia tem uma afirmação interessante sobre a aplicação da lei: “Sabemos, pois, que a lei é boa, se alguém dela se utiliza de forma legítima” (1 Tm 1.8). Jesus conheceu de perto como a lei pode ser manipulada por interesses humanos. Ele foi julgado e, apesar da sentença de Pilatos, representante do governo romano que tinha competência para julgá-lo e que “não via nele crime algum”, Jesus foi crucificado. Que sistema é esse que declara inocente e ainda assim condena à morte? Em contraste, poderíamos dizer: que sistema é o nosso que condena, mas afirma que a pessoa é inocente? 

A lei só é boa, justa, sensata, quando aqueles que dela se utilizam o fazem de forma legítima. É possível que a moralidade da política brasileira passe a considerar legítimo o que é criminoso. Getúlio Vargas pronunciou a famosa expressão: “Lei! Ora, a Lei”. Nenhuma lei tem valor moral se não for justa, editada para o bem da coletividade e não voltada para o interesse de indivíduos ou de grupos.

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