Uma das frases mais esquecidas de Jesus é a seguinte: “São os olhos a lâmpada do corpo. Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso; se, porém, os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas. Portanto, caso a luz que em ti há sejam trevas, que grandes trevas serão!” (Mateus 6.22-23). Para muitos estes versículos são difíceis de entender e até parece destoar do restante do Sermão da Montanha, do qual ele faz parte, com pouca conexão com os textos anteriores e posteriores.
Tudo depende da forma como enxergamos. Os olhos filtram os fatos e decodificam as imagens. Nem sempre o que vemos é de fato a realidade, muitas vezes nos equivocamos em fazer julgamentos porque nossos olhos estão deformados. Não é a imagem que é feia, são feios os meus olhos. O que fizeram não é necessariamente mau, mas a forma como interpretamos é que danifica a imagem.
Rubem Alves publicou na Folha de S. Paulo, 20/10/2004, uma belíssima crônica sobre “A complicada arte de ver”. Ele cita William Blake: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Num dado momento, Rubem Alves diz: “Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.”
No caminho de Emaús, dois discípulos andaram com Jesus depois da sua ressurreição, e só o reconheceram. ao partir do pão, quando “seus olhos se abriram”. Outro texto bíblico nos ensina uma belíssima lição. Jesus convida seus discípulos a olharem os frágeis e belos lírios do campo, afirmando: “Nem Salomão, em toda sua glória, se vestiu como qualquer um deles.” E ainda os convida a aprenderem a olhar a vida com encantamento e graça: “Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves?”
Gosto muito do poema de Adélia Prado: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem. Beethoven, com sua deficiência auditiva, era capaz de ouvir intuitivamente as notas musicais de algumas de suas composições compostas na velhice, ainda que não ouvisse seus sons, auditivamente.
Gilberto Gil afirma: “Do luar não há mais nada a dizer. A não ser, que a gente precisa ver o luar. Rubem Alves ainda afirma: “Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.”
Olhos são a lâmpada do corpo. Eles têm a função de iluminar, de trazer clareza às imagens e aos fatos. Entretanto, se, os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas. Mas se os olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso.
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