Hoje
me assustei quando fui fechar a porta de entrada do escritório e percebi que a
Locadora do Lino, meu amigo, estava em reforma. Todos os filmes foram retirados
do dia para a noite, as prateleiras foram removidas, e tive a impressão que outra
loja, com uma temática diferente vai ser instalada no lugar.
A
sua locadora foi, durante anos, uma referência para muitas pessoas. Minha
esposa cinéfila, talvez tenha sido a maior freguesa por anos. Muitas pessoas
lotavam os estacionamentos da rua no final da tarde para escolher o filme
apropriado para o humor daquele dia, e encontrar o filme que melhor combinaria
com a pessoa com quem assistiria.
A
locadora encerrou um ciclo.
Engolida
pelo Netflix, HBO, e canais fechados, deixou de ter sua relevância e perdeu seu
espaço no templo. Muitas vezes para explicar onde ficava a igreja que é
localizada em frente à locadora, usava-a como referência. “Em frente ao Super
Cine”.
Não
sou do tipo da teoria conspiratória, nem de lamentar mudanças que acontecem, nem
da pressão da tecnologia e das inovações. Certamente vou sentir saudade do
sorriso do Lino e de sua esposa, mas acho que a vida está em constante
movimento. Na linguagem de Heráclito, “um constante vir-a-ser”, afinal, “nada
do que foi será igual ao que a gente viu há um segundo. Tudo passa, o tempo
todo passará. A vida vem em ondas como o mar, num indo e vindo infinito”.
O
Super Cine me fala de ciclos. A vida muda. A fila anda. A dor de hoje não vai
durar para sempre. Toda ilusão é passageira. Os ditadores morrem, os poderosos
tornam-se pó, a pessoa de sucesso hoje será esquecida amanhã; aqueles que são
injustiçados serão restaurados. É o ciclo da vida. Uns morrem, outros nascem.
Tudo muda.
Isto
me leva a pensar que não dá para desesperar em nenhuma situação da vida, por
mais bizarra e ameaçadora que seja. Suicídio por pressões situacionais é absolutamente
inconsequente. A vergonha de hoje, será apagada; outros dias virão. Hoje chove,
mas noutros dias bate sol. Desencantos, traições, podem nos levar a pensar que
é o fim – mas para a vida e para a poesia, pode significar o começo. O caos
abre portas que antes não víamos, por causa da ordem e da estrutura; a mudança
que hoje aterroriza, a bagunça atual pode apontar novas oportunidades.
Gosto
muito do conceito de arrependimento na língua hebraica. Significa “voltar
atrás, recomeçar”. Descobrir que o caminho trilhado não era reto, mudar de
direção. Este conceito judaico-cristão é muito importante. A vida tem recomeços,
dá para refazer a história e acreditar que apesar de toda confusão, e todos os
atalhos tortuosos, o design divino da existência humana traz a marca das
possibilidades e alternativas. Dá para tomar outra estrada, descobrir e trilhar
novos caminhos. Arrepender-se.
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