Na cruz existe um angustiante brado de
Jesus: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparastes?”. Para alguns, este
lamento reflete apenas o sentimento que Cristo experimenta ali na cruz, não que
Deus de fato o havia abandonado, mas sim uma sensação de esquecimento que ele
enfrenta na solidão do calvário.
Você mesmo deve ter experimentado este
senso de orfandade e solidão. Quantas vezes ouvi pessoas dizendo que Deus se
esqueceu delas, e que não sabem se Ele tem conhecimento das coisas que lhe
estão acontecendo. Personagens bíblicos como Habacuque, Jó, também relatam este
mesmo sentimento de abandono. Jeremias chegou a exclamar: “Serias tu para mim,
como um ilusório ribeiro de águas, como águas que enganam?”. O salmista várias
vezes expressa também esta sensação de abandono. “O teu Deus, onde está?”.
No livro The magnificent defeat (A esplêndida derrota), Frederick Buechner
escreve: “Pois o que precisamos saber, é claro, não é apenas que Deus existe,
não apenas que além do brilho metálico das estrelas há uma inteligência cósmica
de alguma espécie que mantém o espetáculo em andamento, mas que há um Deus aqui
no centro de nossa vida cotidiana, um Deus que pode não estar escrevendo
mensagens a respeito de si mesmo nas estrelas, mas está, de um modo ou de
outro, tentando passar mensagens pela barragem da nossa cegueira, enquanto nos
movemos aqui em baixo mergulhados até os joelhos nos fragrantes estrumes,
mistério e maravilha do mundo. Não é prova objetiva da existência de Deus o
fato de que não queremos alguma coisa além de experimentar a presença de Deus.
Esse é o milagre que na verdade buscarmos, e é também, creio, o milagre que na
verdade obtemos”.
Em determinados momentos de nossa
vida, Deus parece desaparecer. Naturalmente Deus não cochila nem dorme, ele é o
guarda de Israel. Quando tudo parece perdido, o encontramos nos lugares mais
inusitados, como Agar, que no desespero foge de casa indo para o deserto e ali
encontra Deus, e isto a impacta: “Certamente este é um Deus que vê”. Quando
Jesus afirma "Deus meu, Deus meu;
por que me desamparaste” ele poderia estar expressando este sentimento de
desamparo. Aqui vemos o Filho de Deus, uma das três pessoas da Trindade,
bradando ao Pai e perguntando sobre o sentimento de abandono que enfrenta. Aqui
vemos Deus abandonando a Deus, mas este mesmo Salmo 22, que é agora citado por
Jesus na sua humilhação na cruz, diz o seguinte: “Pois não desprezou, nem
abominou a dor do aflito, nem ocultou dele o rosto, mas o ouviu quando lhe
gripou por socorro” (Sl 22.24).
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