A opacidade é um dos mais recentes conceitos da chamada pós-modernidade. Sob o ponto de vista gramatical, trata-se do estado ou propriedade do que é opaco, sem transparência. Na medicina, fala-se da opacidade da córnea, distúrbio que atinge a estrutura transparente localizada na frente do globo ocular e que pode causar sérios problemas visuais.
Assim como na medicina, nos âmbitos governamental e jurídico, opacidade é a falta de transparência, mas é um conceito que se torna ainda mais relevante no campo das relações. Corporações que detém certo saber tendem a rebuscar a linguagem para dar a impressão de que são melhores do que seus leitores comuns, de que sabem mais do que eles, o que lhes dá poder. Isso acontece com os médicos, com os juristas e com os economistas.
Doutor em Filosofia, Alexandre Marques Cabral diz que no atual mundo individualista as pessoas “se esbarram”, mas não “se encontram” de verdade. “Há uma falta de pertencimento nas relações humanas. Não são relações viscerais. As pessoas se esbarram nas ruas, mas não existe o encontro verdadeiro. A indiferença se tornou um ato normativo. Nosso desafio é como pensar a felicidade como integridade em um contexto de opacidade e desilusão.”
Trata-se da opacidade do sujeito, algo que se contrapõe, por inteiro, à concepção grega de felicidade, que só poderia ser encontrada na vida relacional. Para o mundo grego, não há felicidade sem o outro, sendo impossível pensar na concepção que enfatiza a felicidade individual.
O conceito da opacidade relacional aplica-se diretamente ao conceito de “modernidade liquida” do sociólogo e filósofo polonês Zigmunt Bauman. Para ele, na era da informação, a invisibilidade equivale à morte e ele também diz que estamos todos solitários, mas inseridos em uma multidão ao mesmo tempo. Segundo Bauman, a internet e o facebook nos tranquilizam e nos dão a sensação de proteção e abrigo, afastando o medo inconsciente de sermos abandonados. “Na verdade, muitas vezes você está cercado de pessoas tão solitárias quanto você”, sentencia.
Nesse contexto surge a sociedade do cansaço, que perdeu o eros, a perspectiva da existência, o prazer da vida. Suicídio se torna uma opção razoável e desejada. Falta um sentido maior. Vivemos como se estivéssemos em um teatro de sombras, pois vemos as coisas se movimentando, mas não sabemos exatamente o que é.
A Bíblia fala da cura de um cego e quando Jesus lhe perguntou se ele via alguma coisa ele respondeu vagamente: “vejo homens, como árvores os vejo andando.” Então Jesus toca nele pela segunda vez para que ele tivesse a visão perfeitamente restaurada.
Infelizmente, a sociedade moderna percebe as coisas, vê os movimentos, mas não identifica e nem sabe exatamente o que está acontecendo. Coisas são colocadas no plural. Não há verdade, mas verdades; não há ideia, mas ideias; não há diversidade, mas diversidades. Perdeu-se a noção do certo e do errado e tudo é relativizado. Tudo se torna opaco. Esbarramos na incapacidade de ver e julgar (palavra proibida e censurada), perdemos a perspectiva crítica e assim, todo conceito se torna preconceito. Tornamo-nos presos pela opacidade. Ai! Ai de nós!
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