sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

E se fosse possível fazer diferente?


Resoluções de Ano Novo são tão inúteis quanto mascar chicletes para resolver questões de matemática. Se você é mais jovem, possivelmente vai discordar de mim, mas depois dos 40, você vai entender o que eu digo... (e olha que Elis Regina falou em não confiar em ninguém com mais de 30 anos).

Mas, e se fosse possível mudar? E se a passagem deste ano se tornasse um marco e diferencial para sua história de vida, o que você faria de diferente?

Partindo do pressuposto de que é possível, escreva no papel as mudanças desejadas, até aquelas que lhe parecem absurdas, mas que se acontecessem, seriam maravilhosas. Depois leia a lista de resoluções, elimine as que forem bizarras demais e fique apenas com algumas mais razoáveis. Esta é uma dinâmica simples que ajuda na resolução de conflitos.

Depois disto, concentre-se em uma ou duas atitudes que mudariam sua vida, casamento, espiritualidade... Ore! Peça a Deus que o ajude e entenda que “melhores atitudes nos levam a maiores altitudes”.

A vida está cheia de exemplos de pessoas que mudaram para pior. Felizmente, há inúmeros relatos de pessoas que mudaram também, para melhor.

Considere um personagem bíblico: Daniel. Sim, aquele mesmo que foi lançado numa cova de leões por ordem de Dario, Imperador da Pérsia. Sua história pessoal é marcada pela brutalidade e violência. Levado cativo para a Babilônia, viu sua cidade destruída pelos inimigos, não há relatos de sua família, e por inferência podemos imaginar que seus pais foram mortos na guerra, os símbolos sagrados, o templo de Jerusalém, tudo estava destroçado. Seguiu uma longa viagem pelo deserto como escravo, humilhado. Ao chegar na Babilônia foi colocado sob supervisão de Aspenaz, que era o chefe dos eunucos.

Sabe qual o significado disto? Ele se tornou eunuco. Isto é, foi castrado para servir no palácio e transitar pelos haréns dos reis sem representar ameaça.

Sua existência foi de negação. Sua vida insistia em dizer não. Isto levou Daniel a desistir de viver? Suicidar? Se transformar numa vítima? Não! Antes se tornou um dos principais do reino e mesmo quando os babilônios foram derrotados pelo poder dos Medos e Persas, ele continuou em cargo de liderança política, por causa da respeitabilidade que possuía.

A Bíblia diz que Daniel tinha um “espírito excelente, conhecimento e inteligência, e era capaz de solucionar enigmas e casos difíceis (Dn 5.12), sendo fiel em todas as coisas não se achava nele erro nem culpa (Dn 6.4). Daniel decidiu que não seria escravo das circunstâncias, nem se transformaria numa vítima, mas tomou posições claras e assumiu o controle de sua história por causa do seu temor a Deus.

A verdade é que “não adianta sonhar com um ano novo, se as atitudes forem velhas”, mas é sempre possível construir um novo caminho, quando nos lembramos que o Carpinteiro de Nazaré é especialista em madeiras tortas.

sábado, 24 de dezembro de 2016

O Deus acessível



Todas as religiões possuem pressupostos sobre suas divindades e agem de acordo com a convicção que possuem delas, afinal, “os homens se parecem com seus deuses”.

Para algumas, Deus é misterioso, nebuloso, incompreensível, envolvido em mistérios, insondável. Trata-se de um ente diferente, distante, sublime, e muito difícil ser tocado. Animistas, religiões místicas e esotéricas, desenvolveram esta visão de Deus.

Para outras, Deus é enigmático, irreconhecível, inacessível, ainda que se comunique com os homens, não é possível elaborar qualquer concepção sobre ele, porque ele é o “numinoso” conforme Rudolf Otto em “The Idea of the Holy “(1917) e C. G. Jung que via o encontro com numinoso como uma característica de toda experiência religiosa. Bultmann falava do “inteiramente outro”.
Em outras religiões, Deus é uma extensão do eu. Nada mais que o interior absorvido e potencializado pela eternidade. Deus não é o “outro”, mas o “eu-estendido”, agindo na subjetividade. Assim afirma o budismo, uma religião com rituais mas sem uma concepção clara de Deus, nesta tradição não existe oração (dirigida ao Outro), mas contemplação (voltada para a interioridade), ainda que isto pareça estranho.

O islamismo desenvolve a ideia de um Deus forte, guerreiro, poderoso, conquistador e justo, que não suporta pecados e incoerências humanas, e pronto a punir os ímpios. “Allah é grande!” O “maktub”, pré-determinista e fatalista define um pouco desta divindade. O “jihad” é concebido como forma de julgamento dos fieis contra os ímpios, e a blasfêmia contra este deus é inaceitável e deve ser combatida com ira. Deus nunca é concebido como Pai, embora seja identificado como guerreiro.
Os judeus conceberam Deus como alguém assustador. Na entrega das tábuas da lei de Moisés, as pessoas precisaram ficar longe do Monte Sinai, pois quem se aproximasse, morreria. O templo e sua arquitetura revelam este distanciamento. Qualquer pessoa que não fosse judia e adentrasse o lugar dos santos, morreria; qualquer pessoa que fosse judia e decidisse entrar no santo dos santos, também morreria.

Quem poderia conceber um Deus acessível?

O Natal nos fala disto.
Jesus é Emanuel, que quer dizer “Deus conosco!”

O apóstolo João se maravilha ao descrevê-lo: “O que era deste o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos próprios olhos, o que contemplamos e as nossas mãos apalparam com respeito ao verbo da vida. E a vida se manifestou e nós a temos visto”(1 Jo 1.1).

Deus assume forma humana, no rosto de uma criança indefesa e frágil, que precisa cuidados de mãe e pai, o Deus eterno se torna carne. Plena humanidade. Não tinha apenas a “semelhança” humana, como queriam os docéticos, mas tinha na sua essência a humanidade, era 100% homem, suscetível a todas as necessidades humanas, sentia fome e frio, e tinha necessidades emocionais e fisiológicas.

Jesus chama a Deus de “Aba, Pai” no Getsêmani (Mc 14.36). “Aba” é uma expressão de ternura, usada afetivamente pelas crianças de colo ao chamarem o seu “paizinho” ou “papai”. Esta expressão segundo J. Jeremias não encontra analogia na literatura da época. Neste sentido, em nenhum texto do Antigo Testamento ou na literatura judaica, alguém se dirigiu a Deus como “Aba, Pai” (J. Jeremias, Teologia do Novo Testamento. São Paulo, Hagnos, 2008) p. 69

Aba, em sua origem é uma forma de balbucio de uma criança recém-desmamada e, para os judeus, certamente pareceria falta de respeito se dirigir a Deus como “Aba, Pai”.
Leonardo Boff, tecendo considerações sobre a humanidade de Cristo, afirmou: “alguém assim tão humano, só poderia ser Deus”. Natal aponta para um Deus transcendente, mas imanente, alguém sublime e majestoso, mas tangível. O profeta Isaias descreve Deus como alguém que habita num alto e sublime trono, mas também com o humilde e abatido de espírito. Deus é grande, intransponível, misteriosos, mas absolutamente acessível.

Em Jesus, vemos este Deus que se aproxima da raça humana, se deixa tocar, caminha nas estradas poeirentas da Galileia, absolutamente Deus, completamente humano. Cumpria-se assim a promessa do anjo Gabriel ao anunciar seu nascimento a Maria: “Ele será chamado Emanuel, que quer dizer: Deus conosco!”. 

É isto que os Evangelhos falam sobre o Natal!

Plena Alegria



Não nos enganemos: O maior desejo do coração do homem é a alegria.

Certamente você deve pensar em algo que lhe pareça mais essencial. Sim, é verdade que desejamos muitas outras coisas, lutamos por elas, trabalhamos duramente para conquistá-las, lamentavelmente sacrificamos consciência e até mesmo a pureza da fé no afã em encontrar aquilo que pensamos que dará sentido, status e valor, mas inconscientemente buscamos algo mais profundo – a alegria.
O problema é que julgamos que, tendo isto ou conquistando aquilo o senso de plenitude virá. Fazemos letais e fracassadas associações: “quando fizer isto...”ou, “quando conquistar aquilo...”e como na lenda do pote de ouro no final do arco íris, o caçador cansado não encontra o que procura e  morre extenuado.
Por definição, esta busca insana e obsessiva por coisas é, teologicamente, um ídolo. Ídolo é um substituto de Deus, pretende ficar no lugar de Deus e assumir seu lugar. Facilmente os construímos em nosso coração e se você deseja identificá-los, pergunte sinceramente: “O que desejo, temo e amo mais do que a Deus?”
Por mais estranho que possa parecer numa cultura hedonista como a nossa, alegria não pode ser o alvo da vida.
Alegria é resultado. Não a causa, mas a consequência. Assim como o sono, se você o busca obsessivamente, não o encontrará. Portanto, não deite dizendo: “eu quero dormir, eu preciso dormir”. Enquanto se preocupar com o sono em si mesmo, não o encontrará. Quando esquecemos do sono, ele vem. A mente precisa desligar. Ao buscar a felicidade dizendo que precisa encontrá-la, certamente ela não será achada.
O apóstolo João, numa de suas cartas no final de sua vida declarou o seguinte: “Estas coisas vos tenho dito para que a vossa alegria seja completa” (1 Jo 1.4). Ele fala de algo que poderia trazer plena alegria. Que segredo ele encontrou que a cultura moderna perdeu?

Para entender o princípio, precisamos ler o texto anterior:
Ora, a vossa comunhão é com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo”(1 Jo 1.4).

O segredo da alegria estava em Deus, na comunhão, amizade e intimidade do povo de Deus com o seu Criador.
João falava disto com propriedade, já que poucas pessoas foram tão violentadas nos seus direitos pessoais quanto este homem. Exilado em Patmos por causa de sua fé, viveu num ambiente hostil, prestando serviços de escravo, espoliado de todos os seus bens, distanciado de seus queridos, mas nestas condições pode contemplar o céu e a glória de Deus.
Alguém afirmou o seguinte: “Adão viveu no Paraíso e não estava satisfeito. João em Patmos, teve visões celestiais. Isto demonstra que o importante não é o lugar ou as condições nas quais você vive, mas como está o seu coração”.

No abandono e exclusão, João teve a benção de encontrar a plena alegria na comunhão com o Pai, e com seu Filho, Jesus Cristo.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Natal e as profecias

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Atualmente muitos se autodenominam profetas. Eu também falo de coisas com grandes probabilidades de acerto, e eventualmente acerto, mas definitivamente não sou um profeta. Os verdadeiros profetas do Antigo Testamento, não agiam como os meteorologistas fazendo previsão de tempo, com possibilidades de errar. Eles tinham que estar absolutamente certos. Não havia margem para erros em julgamentos ainda que fossem mínimas. Também não previam generalidades como “amanhã o sol vai nascer”. O teste para discernir falsos e verdadeiros profetas era apenas um: A previsão deveria estar 100% correta, caso contrário seriam condenados à morte (Dt 18.21-22). 

Como profetas só poderiam ser aprovados com nota máxima, caso contrário, seriam apedrejados. Era um chamado de altíssimo “risco”. No ano 710 a.C., o imbatível exército da Assíria cercou Jerusalém para conquistar a cidade. O povo de Israel ficou paralisado de medo, nada poderiam fazer diante do poderio bélico. O assustado rei Ezequias chamou o profeta Isaías pedindo para que orasse por livramento. Isaías lhe disse para não ficar amedrontado, porque o poderoso imperador Senaqueribe, ouviria um rumor de problemas internos no seu país, e retornaria para sua terra sem atacar Jerusalém. E foi exatamente isto que aconteceu (Is 37.26-38). Profecia cumprida!

Noutra ocasião predisse que a invencível Babilônia seria conquistada pelos Medos (Is 13.17-22), e apesar de toda glória e poder militar, 150 anos depois aconteceu exatamente como havia previsto (Dn 5.1-31). Profecia cumprida!

Outra profecia impressionante, porém, estava relacionada com o Nascimento de Cristo, o Natal. O que ele diz é algo impressionante e que foge ao senso comum. Ele fala de uma “virgem” se engravidando, e que seu filho seria chamado de “Emanuel”, que quer dizer, Deus conosco. “Portanto, o Senhor mesmo vos dará um sinal: eis que uma virgem conceberá, e dará à luz um filho, e será o seu nome Emanuel” (Is 7.14). Não é algo impressionante? Miquéias, outro profeta, afirma que ele haveria de nascer em Belém (Mq 5.2). Estas profecias só se cumpririam 800 anos depois. Não é isto algo impressionante? Profecia cumprida!

Estou certo de que fé é algo desafiador e individual, mas não deveríamos pelo menos refletir sobre a validade destas afirmações? Esta seria uma atitude honesta para pessoas que constantemente afirmam que precisam de provas mais racionais. Não acham? 

Curiosamente, quando os magos chegaram a Belém e indagaram sobre o nascimento do Messias, alegando ter visto um sinal no céu e que vinham de longe para averiguar os fatos (cerca de 1800 Kms de distância), os escribas e doutores da lei, que trabalhavam com tais profecias, deram as informações corretas, citando até mesmo o local de seu nascimento, mas não foram observar se tais profecias estavam se cumprindo em seus dias, e estavam a apenas 12 kms de Belém. Tão pertos, mas ainda tão distantes! Pronto. Mas uma profecia cumprida!

Mais prudentes foram os pastores, que ao ouvirem falar de que o salvador, Jesus Cristo, havia nascido na cidade de Davi, resolveram averiguar: “Vamos até Belém, e vejamos os acontecimentos que o Senhor nos deu a conhecer” (Lc 1.15). Os magos e os pastores creram; os sacerdotes, teólogos e escribas, não. Ainda hoje, alguns creem, outros não!

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Sem saída

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Rubem Alves escreveu, um livro repleto de paródias e crônicas com título sugestivo: “Pensamentos que tenho quando não estou pensando”. Pensando nisto, queria propor outra reflexão similar: “Que solução é possível quando não há solução?”, ou, “pra onde ir quando não há pra onde ir?”
Pode parecer irônico, mas a verdade é que, muitas vezes somos colocados em desfiladeiros e emboscadas, trilhas que nos levam a lugar nenhum, e, emparedados não vemos a luz do sol nem qualquer saída plausível. Em inglês usa-se a expressão “no way out”, isto é, “sem saída”.
Na conhecida série de J.R.R.Tolkien, “O Senhor dos anéis”, os protagonistas principais são quase sempre levados às situações limites. A frase “não há esperança!” é repetida muitas vezes. Embora seus livros sejam recheados de elfos, hobbits e seres místicos, e a realidade do mal seja concreta e palpável, não há de forma clara, a ideia de um Deus. Apesar deste “ocultamento intencional”, já que Tolkien era um católico praticante, sempre surge uma saída inesperada e a solução aparece.
São muitos os que pensam não haver uma saída.
Creio que a depressão, o desespero e mesmo o suicídio sejam muitas vezes resultantes da incapacidade de se perceber qualquer possibilidade para vida. Acompanhei um amigo que passou por um duro processo de divórcio, e muitas vezes estive com ele encorajando-o, dizendo que as coisas iriam mudar, mas ele sempre insistia que não suportaria a tristeza. Num dia especialmente dolorido afirmei que ainda iriamos rir desta história, e ele, olhos vermelhos, chorando, tentando esboçar um sorriso me disse: “Não brinque com minha dor!” Tornando curta uma longa história, recentemente vi fotografias suas passeando com uma loira bonita pelo nordeste brasileiro: Acho que ele encontrou uma saída e está bem...
Um dos livros que mais desafia o intérprete na Bíblia é Jó.  Suas questões são filosoficamente graves. Deus é um dos personagens do texto que aparentemente se oculta e desaparece. Jó está sempre perguntando o porquê das coisas e Deus permanece silencioso. Num dado momento sua mulher se cansa de sua resignação e explode: “Ainda conservas a tua integridade? Amaldiçoa a Deus e morre!” Ela propõe a Jó uma ruptura radical de oposição a Deus e sugere que ele se suicide.
Como Jó responde a esta situação aparentemente sem saída? “Falas como qualquer doida, temos recebido o bem de Deus e não receberíamos também o mal”. Posteriormente afirma: “Eu sei que meu Redentor vive, e por fim se levantará sobre a terra”. Sua esperança, quando não há esperança, está em Deus, o único lugar para onde se pode caminhar quando não se vê saída. Sua fé constrói a ponte sobre o caos, a dor e o desespero, e lhe dá a resiliência necessária até que novas e miraculosas portas se abram.

Com Deus não há estradas sem saída. Quando o Mar Vermelho adiante se mostra intransponível, e o exército egípcio se encontra ameaçador por detrás, a saída aparece. O milagre de Deus acontece abrindo caminho seco e surpreendentemente enxuto para atravessar. Sempre há saída!

sábado, 26 de novembro de 2016

O Diálogo


Hoje, dia 26.11.2016, faleceram duas pessoas curiosas, com backgrounds e convicções completamente diferentes. Fidel Castro e Dr. Russel Shedd. Um aos 90 anos de idade, outro aos 87. Um aclamado e reconhecido no mundo inteiro, outro conhecido num segmento bem específico no Brasil. Ambos viveram e lutarem pelo que creram, embora tivessem cosmovisão e interpretassem a vida de forma completamente distinta. 

Fidel Castro era marxista-leninista, revolucionário, carregava no peito a utopia de transformar a história, para ele as opções estavam polarizadas entre “socialismo ou morte”, por isto apoiou movimentos de lutas e guerrilhas de esquerda ao redor do mundo, e exerceu enorme fascínio sobre os movimentos libertatórios da América Latina. 

Viveu de acordo com suas convicções, assumiu Cuba num movimento sangrento em 1959, tirando-a das mãos do corrupto Batista Fulgêncio, presidente eleito da ilha de Cuba entre 1940 e 1944, e ditador cubano entre 1952 e 1959, até ser derrubado pela Revolução cubana. No poder, sustentou e treinou guerrilheiros e militares, apoiando movimentos de esquerda no mundo inteiro. Muitos artistas e intelectuais do Brasil eram ardorosos defensores de seus princípios e métodos. A ex-presidente Dilma Roussef, recentemente construiu um porto em Cuba, num contrato de gaveta do BNDES no valor de 720 milhões de dólares, cujo conteúdo só pode ser aberto, por força de lei em 2026.

Para alguns ele era um demônio, para outros, um deus. Para uma boa quantidade de pessoas, um mito. 

Dr. Russel Shedd era boliviano, filho de missionários americanos. Viveu no Brasil por 40 anos e era pregador do Evangelho. Possuía doutorado em grego, língua original em que foi escrito a Bíblia (Novo Testamento), e se esforçava para traduzir o pensamento de Cristo e dos apóstolos aos seus ouvintes. Nunca esteve conectado aos poderes públicos, viveu de forma praticamente anônima pela mídia, e anunciava o grande projeto de Deus para a humanidade, ensinado por Jesus, que morreu para resgatar e redimir os pecados da raça humana, perdoando assim os pecados de todos os que nele cressem.

Era homem de uma espiritualidade profunda, sem os cacoetes de “homens espirituais”, tinha um profundo e singelo amor por Cristo e no final de sua vida, já fragilizado pelo câncer, afirmou que através da dor, estava “desmamando do mundo”, e que ansiava pelo gozo celestial e pela vida eterna que teria com Jesus. Assim como Fidel, viveu e morreu de forma coerente com aquilo que cria.

Peter Kreeft é um filósofo cristão, professor da Boston University, e escreveu o livro “O diálogo”. O pano de fundo de sua ficção era a possibilidade de três conhecidos personagens da história, que morreram no dia 22 de novembro de 1963, se encontrassem numa antessala do mundo porvir. Eram eles: Aldous Huxley, romancista ateu, sem qualquer convicção religiosa; John Kennedy, estadista e político; e C.S. Lewis, escritor cristão. Usando os escritos de cada um, e o pensamento que norteava cada um deles, imaginou qual seria a validade de suas afirmações depois da morte. É um livro interessante...

A ficção de Kreeft me faz indagar, quais seriam as argumentações de Fidel e Shedd, se tivessem agora a oportunidade de conversarem sobre seus pressupostos e conceitos. 

Estaria Shedd frustrado por ter ensinado um monte de enunciados que não valem nada após a morte? De falar de um Cristo que vive no imaginário coletivo de milhões de pessoas ao redor do mundo? Compreenderia, finalmente, que ensinou sua fé aos outros, mas que nada disto era coerente? Estaria Fidel dizendo agora: “Não falei? Este negócio de vida após morte é balela?”. Seriam os conceitos de Fidel sobre Deus válidos neste momento de transição, ou estaria Shedd com a razão?

Os leitores também poderão alternar entre a convicção de um ou de outro.

É tudo uma questão de perspectiva...

Fidel estava convencido do materialismo dialético hegeliano...

Shedd preferiu seguir o pensamento de Paulo: “Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda”. 

Descartes afirmou: “Muitas vezes as coisas que me pareceram verdadeiras quando comecei a concebê-las tornaram-se falsas quando quis colocá-las sobre o papel”.

Certamente Jesus nunca deixou em dúvida o que ele enunciou. Pelo contrário afirmou: "Na minha casa há muitas moradas, se assim não fora, eu vo-lo teria dito, pois vou preparar-vos lugar", noutro lugar afirmou: "Aquele que crê em mim, nunca será confundindo", num texto paralelo outro evangelista colocou. "Aquele que crê em mim nunca será envergonhado!". 

Não é maravilhoso seguir para o céu com convicções tão claras no coração?

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Emoções distorcem a realidade

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Certa pessoa, desempregada há vários meses, com todas as suas finanças em desequilíbrio, procura o terapeuta por causa de uma grave crise no seu casamento. Depois de um tempo de conversa e apoio, pode ver que aquela, definitivamente, não era boa hora para discutir relacionamento conjugal, afinal, poderia ele julgar corretamente os fatos debaixo da pressão da falta de recursos financeiros?

Uma jovem recém casada procura sua mãe, sentindo-se inadequada, triste e deprimida. Sua mãe, sabiamente a indaga se naqueles dias em que estava na sua tensão pré menstrual, ela estaria apta para julgar a realidade sem que fosse afetada pelas suas alterações hormonais.  A jovem compreendeu que realmente não estava em boas condições, já que sua TPM a fazia distorcer os fatos, fazendo com que os problemas parecessem maiores do que realmente eram.

Na Bíblia encontramos o relato e desabafo do salmista Asafe, um dos grandes músicos de Israel, e sua visão sobre Deus estava profundamente alterada. “De noite indago o meu íntimo, e meu espirito perscruta. Rejeita o Senhor para sempre? Acaso não torna a ser propício? Cessou perpetuamente sua graça? Esqueceu-se Deus de ser bondoso?” Ao lermos atentamente estes versículos concluímos que algo estava distorcido na sua compreensão sobre o Eterno, mas em seguida, ele faz a seguinte observação: “Então, disse eu: Isto é a minha aflição!

Em todos estes casos, podemos perceber que as leituras que faziam estavam sendo distorcidas por uma circunstância ou pela saúde, e isto é muito mais comum do que imaginamos. Portanto, considere o seguinte: Ao fazer julgamentos duros, implacáveis e severos demais sobre a vida, os outros, sobre você ou Deus, pergunte a si mesmo: Estou emocionalmente bem para avaliar corretamente os fatos ou estou deixando que a pressão do momento, o stress ou meus hormônios me dirijam?

Conflitos, enfermidades, lutos e tragédias podem nos desequilibrar, e quando tomamos decisões ou fazemos asseverações radicais nestes momentos, quase que inevitavelmente nos equivocaremos e traremos consequências danosas para nossa vida.

Então, se conseguir lembrar, veja se as emoções, a situação e a saúde são aliados ou inimigos. Se perceber que algum destes fatores o leva a julgamentos equivocados, reflita um pouco mais, antes de ser conclusivo. Outros momentos melhores virão quando, com ânimo sereno, você terá condições de julgar melhor os fatos.


Dráuzio Varella, no livro “o fio da navalha” afirma que “preconceitos distorcem a realidade mais do que alucinações”. O mesmo podemos dizer das emoções. Uma pessoa debaixo de pressão, pode encontrar dificuldade de ver as coisas como de fato elas são, e avaliar baseado naquilo que parecem ser. Cuidado com seu emocional: ele pode distorcer seus julgamentos e até mesmo a realidade.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Solidão antropológica


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Embora o homem moderno esteja se tornando cada vez mais solitário e distante, a ancestralidade orienta a raça humana à comunidade. Fomos feitos para viver em grupos, e não separadamente.

Você jamais verá um homem primitivo, alijado ou separado socialmente de um clã. O homem da caverna vivia em grupos familiares, e os selvagens dos lugares mais remotos viviam em aldeias, partilhando a comida, copulando, criando filhos e protegendo-se mutuamente. Em algumas culturas, até mesmo a criação de filhos era algo comunitário. Viver de forma solitária é uma impossibilidade antropológica, antes de ser sociológica ou religiosa. As pessoas viviam em agrupamentos, aglutinados pelos deuses, símbolos e linguagem.

A sociedade atual, porém, contrariando toda sua matriz, tem insistido na privacidade. Quer viver do seu jeito, lutando pelos seus interesses, sem considerar a profícua experiência de viver comunitariamente. Boa parte das doenças mentais e neuroses tem surgido, deste desatinado estilo de viver do homem moderno. Já imaginaram um homem das cavernas tendo crise existencial, de angústia, solidão, ou crise de sentido? Podemos até pressupor a existência do medo, como uma realidade visceral e protetiva, mas estas doenças afins são resultantes do isolamento humano.

O aclamado psiquiatra Scott Peck inicia seu livro “The different drum” (O tambor diferente), declarando que a vivência em sociedade é a raiz da esperança. Ele compartilha diversas experiências de pessoas que foram curadas de neuroses ou distúrbios psiquiátricos, apenas por encontrar um grupo de apoio e encorajamento. Ele mesmo admitiu que ao atravessar período de extrema angústia, foi restaurado por encontrar uma comunidade. Esta vivência pode ser encontrada em grupos terapêuticos, grupos de interesse, grupos de “anônimos” ou em igrejas.

A caminhada solitária e privativa tem forte apelo moderno, mas tal isolamento é considerado um dos fatores predisponentes das fobias e crises ansiolíticas. Esta nova proposta de vida não é, do ponto de vista antropológico, a resposta para os anseios humanos, que busca valor e significado. Deus não fez o homem para a solidão. Afinal, não foi ele mesmo quem afirmou “não é bom que o homem esteja só?”


Viver em grupo exige paciência, respeito e perdão. Eventualmente as regras impostas são despropositais e equivocadas, entretanto, na caminhada humana social, na comunicação, no olhar, no toque, na experiência familiar e comunitária, vamos sendo tratados e humanizados. Resgatamos nossa dimensão antropológica perdida. Relacionamentos são fonte de desgaste, mas também de cura; causam de dores, mas redimem. A caminhada solitária tem trazido muita doença emocional e predispõe inexoravelmente da raça humana à extinção. 

A sabedoria milenar confirma isto: “Melhor é serem dois do que um. Porque se caírem, um levanta o companheiro; ai, porem, do que estiver só; pois, caindo, não haverá quem o levante”.  

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Feedback


Chamamos de feedback a reação que um determinado sujeito recebe ao emitir um comportamento. Uma definição rápida de feedback é “a informação que o emissor obtém da reação do receptor à sua mensagem, e que serve para avaliar os resultados da transmissão”.

Existem pelo menos dois tipos de feedback: positivo e negativo. E ambos, nem sempre são válidos. Explico.

Uma pessoa pode dar um feedback positivo à sua atitude, não necessariamente porque o que você fez foi relevante, com excelência, salutar e bom, mas porque ele deseja bajular você, com propósitos interesseiros Pior ainda, como o que você fez foi pobre ou sem muito valor, uma repetição de sua atitude pode denegri-lo ou mesmo levá-lo à ruína. A linguagem da bajulação é muito comum para aqueles que se encontram em posição de liderança, ou pode ser emitida com o propósito de nos dar um senso perigoso de comodismo.

O feedback positivo, na maioria das vezes, é uma fonte de encorajamento. Ele nos anima, nos desafia. Mark Twain afirmava que “poderia viver bem consigo mesmo por um mês, depois de uma apreciação positiva e sincera”. É bom receber elogios, mas não podemos viver em torno deles, e eventualmente, precisamos cuidar para discernir se os motivos são bons ou ruins.

O feedback negativo, pode ser um desastre, mas pode ser importante. A Bíblia afirma: “Leais são as feridas feitas por quem ama; mas os beijos do inimigo são enganosos” (Pv 27.6). Alguns chefes durões, colega casca-grossa, podem impulsionar muito mais nossa carreira do que a conversa mole de quem não nos ama sinceramente. Lemos também no livro de Provérbios que “como o ferro afia o ferro, o homem afia o seu companheiro” (Pv 27.17). Esta experiência não é nada boa, porque tanto a faca que está sendo amolada, quanto a pedra de esmeril, sofrem desgaste no processo. Mas no final, o resultado pode ser bom. “Nenhum líder chegará muito longe se não desenvolver a capacidade de dar e receber feedback” (William Douglas), afinal, “o feedback é o café da manhã dos campeões” (Rick Tate).

Ao receber feedback positivo, é importante avaliar a validade deles. Tome cuidado com a soberba e a vaidade pueris, não se deixe levar pelos elogios. Ao receber feedback negativo, verifique até que ponto é procedente. Pode ser que o que você ouviu foi muito dolorido e até mesmo cruel, mas se for verdadeiro, vale a pena considerar porque é tolo aquele que é advertido e não ouve a exortação, apenas por causa da arrogância e orgulho.

Não sei se aprendi muito sobre este assunto. Sei como meu coração tendente à vaidade tem facilidade em receber apreciação e elogios, mas se recusa a ouvir críticas e análises duras, mas uma coisa é certa. Tenho um grande amigo pessoal, Wilson de Souza, que mora no Rio de Janeiro, e que durante muito tempo foi Diretor Administrativo da Eletrobrás, que certa vez me ensinou, (se eu aprendi é outra coisa), “Feedback é feedback. Ou você o recebe e considera, ou o recebe e joga no lixo”. 

sábado, 5 de novembro de 2016

A Teoria das Janelas Partidas


Em 1969, o Prof. Phillip Zimbardo, da Universidade de Stanford (EUA), realizou uma experiência de psicologia social, deixando dois automóveis idênticos abandonados na via pública, da mesma marca, modelo e cor. Um no Bronx, zona pobre de Nova York, e o outro em Palo Alto, zona rica e tranqüila da Califórnia, e uma equipe de especialistas em psicologia social estudando as condutas das pessoas em cada lugar. 
O automóvel abandonado no Bronx começou a ser vandalizado em poucas horas. Perdeu as janelas, os pneus, o motor, os espelhos, o rádio, etc. enquanto que em Palo Alto manteve-se intacto. Então, os investigadores resolveram quebrar um vidro do automóvel em Palo Alto e aí um processo degradante e rápido se deu com este veículo. Por quê? A explicação é que um vidro quebrado dá a idéia de deterioração e de desinteresse. 
A "Teoria das Janelas Partidas", desenvolvida por Wilson e George Kelling concluiu que o delito é maior nas zonas onde o descuido, a sujeira, a desordem e o maltrato são mais visíveis. Isto é comum em cidades nas quais o poder público e os cidadãos não estão preocupados com a ordem e limpeza. Se um lote está cheio de entulhos, outros terão mais liberdade de jogar mais lixo; se está limpo, as pessoas se sentirão inibidas em sujá-lo. Se os moradores de uma determinada rua resolvem limpar a frente de suas casas, fazer pinturas e reformas, os outros tenderão a fazer o mesmo. Se não se pune "pequenas faltas", como estacionar em lugar proibido, faltas maiores e delitos mais graves surgirão. Se não se pune pequenas atitudes de corrupção, como a de um fiscal de obras, a tendência será de outras pessoas começarem a fazer o mesmo. O sistema público brasileiro está caótico com a corrupção porque pequenas questões éticas foram abandonadas. 
Este princípio foi aplicado em Nova York, uma cidade tradicionalmente perigosa, no combate às pequenas transgressões, como dos grafiteiros, roubo de carteiras e bolsas, alcoolismo, drogas e sujeiras nas estações, e isto posteriormente impulsionou a política de "Tolerância Zero". Alguém explicou assim: “Não é tolerância zero em relação à pessoa que comete o delito, mas tolerância zero em relação ao próprio delito. Trata-se de criar comunidades limpas, ordenadas, respeitosas da lei e dos códigos básicos da convivência social humana”.
A Câmara de Vereadores de algumas cidades do interior de Minas Gerais estão exigindo que os moradores de lotes vagos, murem seus lotes até a altura de 80 cms, e os mantenham limpos. O efeito desta decisão sobre a cidade tem sido transformador. As cidades estão mais bonitas. Se a pessoa não faz a limpeza conforme determina a lei, a prefeitura limpa o lote de 3 em 3 meses, e manda o custo acrescido no IPTU, e é bem mais barato para o proprietário fazer a limpeza por conta própria.
Esta teoria tem enorme impacto no nosso quarto desorganizado, nas finanças desequilibradas e nos relacionamentos interpessoais. Portanto, é bom começar cuidando para que as janelas da alma não tenham seus vidros quebrados...

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Ponto cego



Quando recebemos aulas de direção, somos advertidos quanto ao “ponto cego” do carro. Existe um determinado ângulo no retrovisor que nos impede de ver o veículo ao lado, e uma manobra descuidada pode ser fatal, é o “canto cego”. Pessoalmente já me livrei de um acidente deste, por pura perícia do motorista do carro ao lado, já que, descuidadamente virei à direita sem perceber sua aproximação. Para evitar acidentes, recomenda-se que, além de olhar no retrovisor, é preciso virar a cabeça e dar uma rápida olhada para o lado.

O “ponto cego” aplica-se também à vida. 
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Um garoto foi apanhado roubando o lápis de um colega da escola. O diretor levou isto a sério, chamou o pai para uma conversa e disse que a disciplina poderia ser suspensão ou expulsão da escola. O pai olhou bravo para o filho e perguntou: -“Por que você fez isto. Você sabia que não deveria ter roubado o lápis?”. E o garoto, encolhido se justificou: - “Porque os meus tinham acabado”, e então o pai lhe disse: - “Filho, porque você não me falou? Você poderia ter usado os lápis que eu pego no escritório”.

Percebem a lição? O filho estava sendo julgado por um comportamento que o pai praticava costumeiramente, sem perceber que era errado. Podemos facilmente repreender outros por atitudes que praticamos, e não necessariamente por hipocrisia (o que também pode acontecer), mas por causa destes lados obscuros da alma que não somos capazes de julgar corretamente.

A famosa Janela Johary fala que todos temos áreas escuras (que nem nós nem os outros percebemos); áreas escondidas (nós sabemos e os outros não); as áreas obscuras (não sabemos, os outros sim) e áreas iluminadas (nós e os outros temos consciência delas). Quando mais consciência tivermos, mais justos e íntegros seremos. 

Nem sempre o ponto cego é perceptível e isto pode causar muitas tragédias e dores. 

Jesus criticou a atitude dos “guias cegos”, que coavam o mosquito e engoliam o camelo, que se mostravam belos por fora, mas interiormente estavam cheios de ossos de mortos e de toda imundícia!

Há um provérbio japonês que diz: “O olho pode ver tudo, menos seus cílios”. A vida está cheia de pontos cegos, e muitas vezes somos incapazes de perceber o próprio erro, mas lamentavelmente continuamos julgando e criticando os outros.

Abraham Lincoln afirmou: “Antes de começar a criticar os defeitos dos outros, enumere ao menos dez dos teus. Para você que está chegando agora, criticando o que está feito, deveria estar aqui na hora de fazer. Não sejas um especialista em usar a crítica ao que está feito como pretexto para nada fazer. Assina, aquele que fez, quando no momento de fazer, não sabia-se como”.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Slow food!

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Desde a década de 80, a sociedade ocidental tem adotado o estilo fast food (comida rápida), que ironicamente tem sido mais fast e cada vez menos food. As vantagens são interessantes: Não temos tempo para preparar, parar, conversar ao redor da mesa, e a gordura saturada possui um sabor muito adequado ao paladar. Além do mais, este tipo de alimentação vem quase pronta, com preço acessível e parece responder à questão do imediatismo moderno.

No entanto, pesquisadores estão questionando cada vez mais os riscos de se comer em pé, apressadamente, comidas pré-preparadas, já que esta atitude e este tipo de alimentação comprovadamente trazem sérios danos à saúde física; mas na geração apressada, com enorme senso de urgência, os esforços tem sido desestimulantes da parte das autoridades, médicos, e instituições que se preocupam com isto.   

Uma nova onda, naturalista, porém, está em franco crescimento. Trata-se do slow food (comida lenta), defendendo que comer não é apenas o ato de saciar a fome, mas há alguns ritos implícitos e salutares em se assentar ao redor da mesa, sem presa, conversar e aguardar os processos nos quais o alimento vai sendo lentamente preparado. Por esta razão sempre comenta-se sobre o sabor da comida da mamãe, que parece ser a melhor comida do mundo, e em certo sentido, isto é verdade. Talvez haja alguns elementos como o riso e a celebração, pessoas amadas, transformem o sabor do alimento.

Meus dois filhos moram em outras cidades. Um no Brasil e outro nos EUA. Quando eles chegam de viagem, naturalmente os convidamos para sair e almoçar fora, mas certamente o melhor prato não é comido nos bons restaurantes que temos na cidade, e sim quando todos decidimos preparar, juntos, a comida, a mesa, os pratos, e ficamos juntos conversando e trocando experiências. O ato demorado de se preparar a comida, e cada um é expert em preparar certos pratos, transforma o ato de comer num encontro excepcional.

Minha filha gosta de preparar comida mexicana, meu filho é expert em assar picanha, minha nora gosta de fazer risoto, minha esposa é especialista em pratos caseiros, gosto de fazer uma costela aprendida com meu sogro, e as receitas são assim compartilhadas e os pratos são devorados com um senso de reverência e alegria. Experimenta-se sacralidade e eucaristia ao redor da mesa, contando casos, lembrando histórias, preparando saladas, lavando vasilha, e tudo é participativo.

O alimento, no conceito da ancestralidade e na experiência tribal, sempre foi um evento comunitário, com efeito sociológico em cada cultura específica. Por isto nos recordamos das cenas recorrentes nos filmes que resgatam esta dimensão antropológica. Come-se devagar, gasta-se tempo ao redor da comida, conversa-se muito, reparte-se a comida, decide-se e celebram juntos. Isto não é possível com o sanduiche apressado na mão, conversando pelo telefone, andando pelas ruas ou em pé diante do balcão, acreditando que parar e comer é um atraso na produtividade e efetividade profissional. Pelo contrário, seremos mais saudáveis e certamente mais efetivos, se entendermos que a comida é melhor, quando não estamos escravizados pela tirania do urgente.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Dúvida como expressão de fé

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Ao ler os Evangelhos observamos que poucos dos que andaram ao lado de Jesus demonstraram fé inabalável. João Batista, na hora da crise titubeou; Pedro o negou; Judas o traiu; Tomé não acreditou quando lhe falaram da ressurreição; os demais discípulos não acreditaram no relato das mulheres que foram as primeiras testemunhas de que ele havia saído do túmulo para a vida. A maior censura de Jesus aos discípulos foi quanto à “falta de fé”. Os fieis nem sempre se mantiveram firmes na hora da provação.

Observa-se uma lógica inversa: Aqueles de quem se esperava fé ousada e profunda, muitas vezes estavam inseguros e pusilânimes, enquanto os que viviam perifericamente o ciclo da espiritualidade, revelaram profunda intrepidez e segurança. Em outras palavras, os “crentes” descriam e os “incrédulos” afirmavam sua fé.

No relato do centurião romano, militar estrangeiro invasor, que fazia parte da cúpula dominante da Judeia, pediu que Jesus orasse pelo seu servo enfermo e quando ele se dispôs a encontrá-lo ouviu deste militar uma declaração tão surpreendente que Jesus afirmou: “Em verdade vos afirmo que nem mesmo em Israel achei fé como essa”. A surpresa talvez se desse porque como estrangeiro era pouco provável que tivesse uma fé grandiosa.

Outra mulher cananéia, também estrangeira, mostra uma fé tão firme que Jesus afirmou: “Ó mulher, grande é a tua fé!”. Parece que os “estrangeiros e distantes”, eram capazes de reconhecer o Messias e demonstrar sua fé de uma forma tão espontânea que tais histórias se tornam ameaçadoras para nós, supostamente os que cremos.

Tenho encontrado muitos “crentes incrédulos” na minha caminhada, ao mesmo tempo, muitos “ateus crentes”. Na verdade ainda não encontrei nenhum ateu que no meio da dor e do luto olhasse a vida serenamente e dissesse: “Não creio em nada e por isto estou muito seguro”, pelo contrário, tenho aprendido a respeitar a falta de fé e considerar a dúvida como expressão de fé. Tenho ouvido lindas e espontâneas confissões de onde não esperava, e eventualmente uma dubiedade e fragilidade quanto a fé de gente religiosa e beata. Como bem afirmou Mario Quintana: “Mas que susto não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo”. Sei que isto é um tanto dialético e paradoxal, mas me parece muito sensato.

No nascimento de Cristo, os “magos”, gente espiritualizada e distante das tradições e profecias judaicas, desenvolveram uma sensibilidade quanto ao sagrado, e chegam até Belém para ver o rei que estava nascendo, enquanto os escribas e religiosos de Jerusalém, que ficavam a 12 Km de Belém, não perceberam. Os magos foram mais crentes que os líderes religiosos.

Muitos talvez estejam titubeando entre a fé e a dúvida, mas este ato de duvidar, revela a centelha da fé. Dúvida é uma forma de crença. Muitos se identificam prontamente com o homem hesitante que declarou a Jesus: “Eu Creio Senhor, ajuda-me na minha falta de fé!”. Como afirmou Philip Yancey: “Uma curiosa lei do avesso parece operar nos evangelhos: a fé aparece onde menos se espera e vacila onde deveria florescer”. 

Tempo e Modo

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Já ouviram falar de mindfulness? Trata-se de um novo conceito empresarial na moda, que procura dizer verdades antigas com roupagem moderna. Seminários e palestras tem sido ministrados atualmente para cargos de liderança em grandes empresas que sempre precisam discutir assuntos de interesses variados, com  discussões apaixonadas e fortes debates. 

Mindfulness se refere ao auto conhecimento que a pessoa precisa ter sobre si mesma no ambiente onde se encontra. É a capacidade de saber participar da discussão, levando em conta o nível do debate, as pessoas envolvidas e o clima da reunião. Quando se considera estes elementos, é possível fazer uma análise mais sensata, saber segurar e esperar para falar na hora certa, com uma palavra apropriada.

Trata-se da capacidade de ter o nível de informação adequado sobre o clima da reunião. O que os outros sabem e porque estão falando. Muitas vezes isto exige controle sobre o próprio corpo, para assim dominar a ansiedade e o nervosismo e se adaptar ao ambiente. Numa reunião empresarial existe muito jogo de ego, e dependendo da forma e da hora em que você falar, o outro vai resistir e não aceitará suas sugestões e suporte, antes se tornará antagonista e opositor.

Não é interessante perceber que estas mesmas verdades foram ditas há muito tempo atrás nas Escrituras Sagradas? Veja o que diz este texto de Eclesiastes: “O coração do sábio conhece o tempo e o modo” (Ec 8.5). Não apenas o tempo, a hora certa; mas também o modo, a forma de tratar as coisas e emitir suas opiniões.

Não é muito fácil equilibrar estes dois elementos. Muitas vezes fazemos no tempo certo, do modo errado; outras vezes fazemos do modo certo, no tempo errado. Pense no efeito prático disto para o seu meio profissional e relacionamentos interpessoais. O seu colega está se comportando de forma equivocada, ou fazendo as coisas sem o conhecimento pleno. Você tem percebido isto já faz algum tempo, e tem vontade de dizer, mas teme sua reação, então, na primeira discussão, na hora em que ambos se encontram irritados, você vomita suas ideias e decide falar. Provavelmente no tempo errado e de forma errada. Ele não vai te ouvir porque está zangado (tempo), e porque as verdades vieram da forma errada (modo). Você errou de duas formas. Não considerou nem o tempo, nem o modo.

Leve isto para o campo familiar. Algumas coisas precisam de reajuste. Você acha que seu cônjuge não está fazendo as coisas corretamente, então, espera o momento certo e do jeito correto, procura dizer aquilo que você acha que precisa ser ajustado. Isto pode produzir um efeito bem mais positivo do que quando dito de forma raivosa, num contexto de apaixonada e agressiva discussão.

Por isto vale muito a afirmação: “O coração do sábio conhece o tempo e o modo” (Ec 8.5). Isto tem a ver com mindfulness.