Na festa familiar do dia de Natal, minha esposa, irmão e cunhada contraíram o influenza H3N2, e no período do final de ano todos passaram por um grande perrengue com esta doença. Minha esposa sofreu muito com uma forte dor de garganta e por quase cinco dias mal conseguia engolir, e até mesmo beber água tornou-se dolorido. Mas era “apenas” uma gripe e ia passar logo. E passou.
Mas quinze dias depois, recebemos a visita de outro vírus, o Covid-19, e desta vez todos da família foram contaminados, inclusive meus filhos que moram foram do Brasil e estavam conosco. Apenas meu netinho de 2 anos não foi positivado. E agora, com minha filha grávida, minha sogra de 86 anos em casa, todos estávamos enfrentando uma ameaça com outros tons: fazíamos agora parte de uma estatística de uma pandemia que só no Brasil já matou mais de 620 mil pessoas.
O que poderia acontecer? Apesar de sabermos que se tratava de uma cepa mais branda todos ficamos assustados com os possíveis desdobramentos e as consequências. Graças a Deus, todos passamos muito bem. Os sintomas não passaram de um gripe leve, e na minha filha foi quase assintomático. Mas era Covid-19. Pessoas ligavam, oravam, queriam saber como estávamos reagindo. Alguns ainda mais cuidadosos nos trouxeram almoço e lanche para nos apoiar e mostrar carinho e cuidado. Minha mãe que mora em Palmas-TO, ligava todos os dias para saber noticias.
No dia 20/12/21, o site da CNN notificou que na cidade do Rio de Janeiro, a Influenza estava matando mais do que a Covid-19, em dezembro quando se tratava de números absolutos,. No último mês do ano, 17 pessoas haviam morrido por Síndrome Respiratória Aguda (SRAG) provocada pelo coronavirus, quase a metade dos óbitos provocados pela gripe no período: 33, de acordo com dados do Sistema de Informações em Saúde da Prefeitura do Rio de Janeiro. Mas poucas pessoas estão, de fato, com medo da gripe. Somos prisioneiros do medo do Covid.
De fato não dá para minimizar o grande desafio da pandemia, mas um aspecto precisa ser considerado. Podemos sucumbir mais aos efeitos deletérios do medo do que da doença em si. E assim deixamos de viver, nos encolhemos nos nossos afetos, restringimos relacionamentos, nos enclausuramos nos nossos temores.
Um artigo da Revista Brasileira de Psiquiatria afirma que “No caso de uma pandemia, além das manifestações físicas, o medo é capaz de aumentar os níveis de ansiedade e estresse em indivíduos saudáveis ou de intensificar os sintomas daqueles com transtornos psiquiátricos pré-existentes.” E fica o medo do vírus e de suas consequências. Medo que pode se exacerbar e se tornar uma “coronofobia”, provocando ansiedade e insegurança, já que desorganiza a previsibilidade, não só em relação ao comportamento do vírus em cada pessoa mas também no que diz respeito ao futuro da carreira, do sustento e dos negócios. Tais incertezas elevam a propensão a transtornos psiquiátricos e geram um evento traumático coletivo, numa dimensão nunca antes observada.
O medo precisa ser enfrentado. Um ditado japonês afirma que “o medo de perder não deixa a gente ganhar”. O medo precisa ser tratado, eventualmente precisamos conversar com amigos, terapeutas, famílias, não num negacionismo inconsequente e irresponsável, nem numa neurose fóbica limitante. O medo não é bom conselheiro. A Bíblia diz que “o amor lança fora o medo”. Talvez seja uma referência ao fato de que comunidade, igreja, família, amigos, todos os atos de solidariedade e amizade podem nos ajudar a terapeutizar, com a graça de Deus, o medo que nos ronda.