É muito comum que pessoas da minha idade falem mal dos jovens. Hoje não quero colocar um olhar sobre a juventude, mas sobre aqueles que estão mais ou menos identificados com a quantidade de anos, não que eu tenho (eu realmente não sei quantos tenho ainda...), mas que eu já gastei. Mesmo porque, tenho aprendido, com muita tristeza, que se alguma coisa está errada na geração atual, quem fracassou foram aqueles de minha idade, que forjaram aqueles que agora estão ai, assumindo papeis como agentes da história. A geração atual é subproduto de quem fomos e do que fizemos. Nossos pais foram responsáveis por formar a geração baby boomers, nós somos responsáveis por formar a geração millenium.
Sou da geração de 60. Na verdade, nasci sete meses antes de 1960 chegar. Olho para os meus colegas, outrora fininhos e magrinhos, e os vejo arredondados. Muitos ostentavam uma cabeleira capaz de impressionar Elvis Presley, e agora estão mais identificados com Bruce Willys. Tais percepções me justificam muito no desequilíbrio da balança, porque nas minhas contas precisaria emagrecer 10 kg, mas aprendi que misery loves company e por isto, prefiro falar dos outros. Infelizmente estou num momento da vida que só de mastigar uma ideia eu engordo 2 kg.
Boa parte dos amigos da minha idade, que rondam ai os 60 anos, são avós. Já descobri que ser avô não é uma grande ideia (isto ajuda a minha racionalização, pois ainda não tenha netos... não que não os queira, mas porque meus filhos estão muito reflexivos e hesitantes quanto ao momento de ter seus filhos), mas o que acontece é que todo avô fica bobo. O poder que uma criança tem sobre a vida de um avô é descomunal, muito facilmente ocorre uma mudança de temperamento, mudança de agenda e até de geografia pelo simples fato de nascer alguém que chora o dia inteiro e reclama atenção integral dos pais – e dos avós.
Minha preocupação pastoral, porém, passa por outras trilhas.
Estou preocupado com a espiritualidade e a fé da minha geração.
Muitos perigos rondam a alma de um homem e uma mulher com 50-60 anos.
O primeiro perigo é o desencanto com a vida. Parece que as coisas entram num lugar comum, repetitivo, monótono, sem graça, por isto este momento é perigoso demais. Não posso precisar cronologicamente, mas imagino que quando Davi se envolveu no grotesco adultério com Bateseba, ele deveria estar com pouco mais de cinquenta anos. Numa tarde modorrenta, depois de assistir um longo seriado na TV, de ter folheado todas as páginas que ele acessava na internet, de ver seu facebook, sem propósitos maiores e sem ter o que fazer, olha para fora e vê a vizinha, em trajes nada recomendáveis. Alma vazia, dinheiro sobrando, muito poder, tempo à disposição. Risco demais!!!
Surge também um certo cinismo com as pessoas. Já vimos tanto, já fomos enrolados por gente malandra, sinistra, com cara boa e coração perverso. Surge um certo desalento e impaciência. Acreditamos que as pessoas não mudam ou que são complexas demais (ou talvez sejamos nós mesmos...) nos tornamos críticos, ácidos, cínicos, julgamos com facilidade, fazemos leituras, nos distanciamos, temos medo...
Quanto à fé, tenho percebido coisas graves no coração.
Muitos se tornaram desiludidos com igreja. Não acreditam mais em pastores, acham as reuniões enfadonhas, dispensáveis e questionáveis, os cultos não mais emprestam sentido, a Santa Ceia tornou-se meramente ritualista. Nos tornamos críticos da igreja, ao invés de sermos colaboradores com ela. Não queremos dar tempo, não queremos investir nosso dinheiro, participamos de reuniões apenas pro gasto mínimo e desencargo de consciência.
Junte-se a isto outros aspectos da espiritualidade: tenho visto muitos lendo a Bíblia com certo cuidado, a Bíblia não os julga mais... eles julgam a Bíblia. Ainda a consideram Palavra de Deus, mas não a consideram mais inerrantes, nem infalíveis, e, de verdade, nem mesmo a única regra de fé e prática. Perderam a alegria da Palavra, os corações não mais ardem quando é Escritura é exposta. Tiago exorta as pessoas a “acolherem a palavra de Deus com mansidão”, mas não raramente a Palavra de Deus é recebida de forma rebelde e reativa.
A vida devocional tem sido esquecida. Ora-se pouco e superficialmente. perdemos o sentido de interceder e clamar pelos outros. Perdemos a disciplina, o prazer de ficar quieto para ouvir a voz do Senhor. Muitos não oram mais, a não ser comunitariamente. Certo amigo chegou a dizer que não entendia porque Daniel perdeu a vida por orar, porque para ele, orar e não orar não faz diferença. Curiosamente, ele nunca se afastou da igreja...
Sem nunca termos pensando nisto, nos tornamos teologicamente liberais:
Não cremos na autoridade final da Bíblia
Não contribuímos mais para a igreja
Não disponibilizamos tempo para discipulado
A vida espiritual se torna monótona e sem paixão
Não evangelizamos
Somos críticos da comunidades.
Assim nos perdemos...
Você já pensou em quanto prejuízo isto traz para o Reino de Deus?
Alguns dos meus amigos de mocidade foram evangelistas, ganharam vidas, pregaram em clubinhos, em encontro de jovens, faziam discipulado. Entretanto, a falta de ardor, os levou à indiferença. Foram neutralizados por uma nefasta ação maligna. Mas esta afirmação não faz diferença, porque boa parte sequer acredita que o diabo exista.
E para a igreja local? Quantos homens e mulheres poderiam ser agora líderes, encabeçando, motivando, envolvendo-se na vida da igreja, recebendo visitantes, acompanhando os novos convertidos, mas não o fazem. Tem muito para dar, mas não querem dispor seu tempo. O conforto e o comodismo se tornaram as maiores tentações desta geração em torno de 50-60 anos.
E os recursos? Já viram como os liberais nunca construíram nada na história? Porquê? Porque o dinheiro deles não serve a Deus. Quando o povo de Deus estava saindo do Egito, Faraó lhes permitiu sair, desde que “o gado e os bens ficassem”. Muitos deixaram seus bens no Egito, não querem trazer para construir o projeto de Deus na história. Planos e desafios missionários são enfraquecidos por falta de recursos, as estruturas das igrejas são ruins, porque o dinheiro que deveria ser investido no reino de Deus, tem sido gasto para viagens caras, auto-satisfação e aquisição de mais conforto e bem estar. O problema é que “mais da mesma coisa me leva para o mesmo lugar” (Hans Burke). Certa vez conversei com uma pessoa que fora dizimista e que tinha um alto salário e agora não contribuía mais, e lhe disse: “Você sabe que a ausência do seu dízimo impede a igreja de iniciar um projeto de plantação de uma nova igreja?”
O inferno ganha quando somos frios, indiferentes, relapsos. Ganha porque não oramos, ganha porque não servimos com nossos talentos, ganha porque perdemos a capacidade de influenciar outros e à nossa geração, ganha porque não investimos financeiramente na obra do Senhor.
Algum tempo atrás, tive acesso a uma música do Stenius, que gerou uma convulsão emocional na minha alma. Sugiro que você a acesse no you tube, caso interesse. A letra segue abaixo:
Senhor do Tempo
Stenius Marcius
Mestre, me veja menino
Deixa-me correr com Teus pequeninos
Mestre, de rosto amigável, de sorriso largo, de sereno olhar
Eu fui a Ti criança e me recebeste de braços abertos
Que estranha distância agora Senhor, lembra do menino que eu fui outrora
Mestre, lembro que eu buscava
E me derramava, choro adolescente
Lembro daquele caderno onde eu anotava minhas orações
Jovem busquei a Ti, o refúgio certo para um moço aflito
Que estranha distância agora
Senhor, lembra do rapaz que eu fui outrora
Mestre, estou bem mais velho
E o amor que eu tinha, onde foi parar?
Mestre, fala a esse homem, que se emocione, vá recomeçar
Faz-me correr e assim retornar ligeiro ao primeiro amor
Deixa-me ver novamente o meu nome Escrito nas santas mãos
do Senhor do Tempo
Que Deus nos ajude!