O pensamento é tosco e bizarro, mas não raras vezes já me peguei perguntando a mim mesmo: “O que meus filhos e netos farão com meus pequenos mimos, lembranças de viagens, placas de pratas e títulos e pequenos souvenirs que guardo com tanto orgulho? O que farão com meus livros, que me custaram caro, e que me acompanharam durante boa parte da minha vida, e eventualmente me impediram de ir a um restaurante melhor porque optei por adquiri-los?” Tenho livro que custou $ 200 dólares.
O que acontecerá às centenas de canetas e relógios que ganhei e comprei e procurava exibir como troféu e status e que hoje se acumulam nas minhas caixas? Ah! E aquelas gavetas entulhadas de pequenos blocos que nunca usarei, de itens como abridores de cartas (que nem recebemos mais...), de barbantes, esponjas de carimbo, envelopes, guardanapos, cadernos antigos e velhas agendas usadas que registravam minha pesada agenda de trabalho?
Chego à trágica conclusão de que estas coisas só servem para mim, e para ser sincero, muitas delas, na verdade, nem mesmo para mim servem mais. Lembro do relato de um querido amigo que perdeu seu pai, homem de posições firmes, objetivos claros, de fortes opiniões que morreu subitamente depois de um fatal e rápido quadro de leucemia, que não durou mais de uma semana. Seus irmãos, reunidos em família, voltando do cemitério, precisavam agora “invadir” o escritório do pai, abrir suas gavetas. Nenhum deles tinha com coragem de “penetrar aquele espaço reservado e sagrado do pai”, repleto de contas antigas, recibos, declarações de imposto de renda, e depois de muita relutância, ele mesmo resolveu assumir a desafiadora função. Seu sentimento foi estranho e perturbador: “Sentia como se estivesse desrespeitando meu pai ao abrir seus armários”.
A verdade é que muito pouco do que temos interessa aos outros. A não ser bens e herança, que na maioria das vezes serve de controvérsia, disputa e separação da família, pouco vale o que acumulamos. Seus souvenirs pouco ou nada valerão. Quando meu sogro faleceu, minha sogra abriu suas coisas e disse que cada um pegasse o que quisesse: ferramentas, canivetes, camisas ainda não usadas, meias. Na verdade, todas aquelas coisas pouco valiam para cada um de nós.
Enfim, o que vale mesmo, são as lembranças de conversas privadas, abraços e risadas, hábitos e atitudes, que reverberarão provocando amargura ou alegria mesmo depois de morto. O que fica de tudo não são os mimos que tanto valorizamos, nem os “recuerdos del Paraguay”, mas valores morais e espirituais que continuarão vivos, depois de nossa partida. O que conta, no final das contas, não são os souvenirs, mas as lembranças e heranças de amor que continuarão a inspirar indelevelmente as futuras gerações.